Pesquisa RACISMO EMPREGO e JUVENTUDE em Niterói e São Gonçalo

A pesquisa A Incidência do Racismo sobre a Empregabilidade da Juventude em Niterói e São Gonçalo constitui uma das atividades de um projeto mais amplo, denominado Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra.

Este projeto se desenvolve entre 2016 e 2019, nos municípios de Niterói e São Gonçalo (Estado do Rio de Janeiro), envolvendo 34 grupos e organizações da sociedade civil. Sob a liderança da Bem TV – Educação e Comunicação, e com o apoio da União Europeia, o projeto tem por objetivo fortalecer grupos e instituições que atuam para promover os direitos da juventude negra.

Nesse contexto, a pesquisa produz subsídios para fortalecer ações que ampliem e/ou qualifiquem a empregabilidade de jovens negros no território abordado.

Ela foi desenvolvida em duas etapas: uma primeira de abordagem quantitativa, e uma segunda de abordagem qualitativa.

O relatório que agora apresentamos descreve a metodologia e os resultados da etapa quantitativa, realizada entre maio de 2017 e maio de 2018, com suporte e parceria do Departamento de Métodos Estatísticos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Os dados foram coletados e analisados por município, visando facilitar a apropriação das conclusões pelos grupos e instituições participantes da Frente Papa Goiaba pela Promoção dos Direitos da Juventude Negra; que atuam politicamente, em sua maioria, no contexto local.

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Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra

A Frente Papa Goiaba surge a partir das fissuras na garantia de direitos de jovens negros e favelados do leste fluminense, que escancaram a necessidade de enfrentar a invisibilidade do racismo institucional em Niterói e São Gonçalo e a urgência de se promover esta discussão com toda a sociedade. Com a missão de assumir esse papel, a Frente investe em três linhas de ação: Produção e Disseminação de Informação, Capacitação e Incidência Política.
Saiba mais da Frente.

 
Contexto e apresentação
 

Cabe destacar que a despeito da qualificação dos profissionais diretamente envolvidos na operacionalização da pesquisa quantitativa (uma professora-doutora em estatística, uma doutora em educação com experiência em métodos quantitativos, 4 alunos extensionistas do curso de estatística da UFRJ, além de 4 entrevistadores) todo o processo de investigação foi operado em diálogo com os grupos/organizações integrantes da Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra. Reuniões do coletivo foram convocadas para apreciação do plano amostral, para análise do questionário utilizado, para definição dos pontos de coleta de dados nas ruas das duas cidades (Niterói e São Gonçalo), bem como para debate dos resultados das análises.

Todo o processo, portanto, foi conduzido em parceria com grupos e coletivos autointitulados como pertencentes aos movimentos negro e de juventudes de Niterói e São Gonçalo. Esses grupos não têm sua identidade vinculada à academia, nem são por esta oficialmente reconhecidos como produtores de conhecimento científico, mas no âmbito do processo aqui apresentado são compreendidos como co-autores e sujeitos essenciais para a abordagem do problema de pesquisa.

Segundo Torres (2007), é a relação dialética com a questão investigada que deve orientar a permanente reconstrução do método científico, e não o contrário, quando esquemas pré-definidos são aplicados como matrizes para enquadrar a análise de fenômenos da realidade. Ou seja, é o problema de pesquisa que define a metodologia para sua investigação. Nessa perspectiva, os grupos integrantes da Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra, a partir do conhecimento que emerge da reflexão cotidiana e da vivência prática, apontaram caminhos, especificaram ênfases e acrescentaram questões que teriam passado despercebidas.

Por suposto, os ideais e lutas de tais coletivos incidem sobre as conclusões da pesquisa. Aparentemente isso iria de encontro à tradição científica, discursivamente vinculada aos ideais de “objetividade” e de “neutralidade”. No entanto, é preciso relativizar tais vinculações que efetivamente não ultrapassam o nível do discurso, já que o método científico, como fruto da cultura, está necessariamente submetido a sistemas sustentados por comunidades interpretativas, que de antemão condicionam o saber produzido (TORRES, 2007). O campo da pesquisa tende a seguir a mesma lógica que permeia outras atividades de teor cultural ou sociológico, submetendo-se às hierarquias, aos (pré)conceitos e à influência do cenário sócio-político e econômico.

No caso da América Latina, de maneira específica, é preciso considerar ainda o longo processo de colonização imposto aos países da região. Essas sociedades terminaram por incorporar os parâmetros concebidos em outras culturas e territórios. Até os dias de hoje esses países se veem enredados em uma estrutura que perpetua a divisão do mundo entre as nações que estabelecem os parâmetros, a via de regra as mais ricas; e aquelas que a estes buscam se adequar (segmento onde se incluem os países latino-americanos). De acordo com Moretti e Adams (2011) a pesquisa têm sido um dos campos preferenciais das disputas epistemológicas e políticas, o que envolve diretamente o desafio da democratização do conhecimento.

Sobre esse tema Djamila Ribeiro (2017) cita Linda Alcoff e sua crítica à ideia de uma epistemologia universal: “É realístico acreditar que uma simples ‘epistemologia mestre’ possa julgar todo tipo de conhecimento originado de diversas localizações culturais e sociais?” (ALCOFF, 2016, apud RIBEIRO, p. 27, 2017). Para essa filósofa panamenha, não pode existir uma epistemologia “universal”, já que uma única linguagem não dará conta da “leitura neutra” (se esta fosse possível) de todos os diferentes códigos produzidos pelas diferentes sociedades. Logo, o que temos é uma epistemologia que se fez hegemônica. À medida que determinadas populações foram subjulgadas por outras – pela via da força e ou da economia –  tais parâmetros do que é e do que não é conhecimento válido lhes foram impostos.

A pensadora e feminista negra Lélia Gonzalez – com quem também dialoga Djamila Ribeiro – lembra que “quem possui o privilégio social possui o privilégio epistêmico” (GONZALEZ, 1984 apud RIBEIRO, p. 24, 2017). A consequência dessa hierarquização é uma ciência eurocêntrica, assumida como “referência” que valida determinados grupos como produtores de “saber científico”, ao mesmo tempo deslegitima outras experiências de construção do saber.

Portanto, aquilo que a ciência tradicional proclama como “neutro” ou “objetivo” está necessariamente comprometido com uma determinada visão de mundo. As pesquisas sempre se pautam por um posicionamento definido e não por neutralidade ou objetividade, por mais que discursivamente afirmem o oposto. Nesse contexto, é justo conceber que o rigor científico passará principalmente pelo enunciado claro dos interesses aos quais determinado processo de investigação se vincula, de modo a estabelecer um diálogo franco com o interlocutor. Sobre essa premissa Pedro Demo afirma que:

A ciência social que nega suas vinculações ideológicas ou com elas não se preocupa, as mascara e não tem condições de as controlar. Ao rejeitar envolvimentos políticos, não só os mistifica, como sobretudo enreda-se com a possibilidade sempre aberta de manipulação por parte dos poderosos (Demo, 2008, p. 56-57).

O autor frisa especificamente a demanda por posicionamento por parte do campo das ciências sociais, mas acreditamos que sendo a ciência como um todo um produto da cultura, também as ciências exatas e da natureza estão condicionadas aos processos e métodos da linguagem e às influências ideológicas. Portanto, manifestar a perspectiva a qual se vincula é obrigação a ser observada em qualquer processo de produção de conhecimento, da mesma forma como se espera que sejam detalhadas técnicas e metodologias utilizadas no levantamento e interpretação de dados. Explicitar o contexto em que se processa uma investigação corrobora para o rigor das análises.

No caso da presente pesquisa, o diálogo se dá com os movimentos negro e de juventudes de Niterói e São Gonçalo. Esforços foram empreendidos para que integrantes desses movimentos tivessem um espaço efetivo de fala no processo.  Nas sociedades estratificadas em que vivemos, marcadas pela diferença, mas também pela dominação e intolerância, o “outro” não fala. Ele é “falado” pelos discursos daqueles que detêm o poder econômico, social e politico (FRANÇA, 2001). Jovens pobres, negros e periféricos são epistemologicamente definidos a partir dos padrões estabelecidos por grupos hegemônicos: um “nós” que não é a maioria, mas que fala como se fosse. Daí a importância de dar voz a esses atores. Trata-se de investigar sua realidade “com eles”, e não “por eles”.

Além de fazer emergir conhecimento de um processo efetivamente dialógico, esta pesquisa também buscou como resultado favorecer aos grupos integrantes da Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra a apropriação dos métodos e processos da produção acadêmica, viabilizando-lhes maior autonomia no diálogo – frequente e desigual – com a universidade[1]. Do mesmo modo espera-se viabilizar ao grupo o acesso qualificado ao conhecimento científico produzido sobre questões de seu interesse.

[1] Muitas são as pesquisas desenvolvidas que tem as juventudes negras do território como “objeto” de pesquisa, sendo sempre difícil, na palavra dos grupos integrantes da Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra obter desses processos (que lhes toma tempo e disponibilidade) um retorno produtivo.
Análise dos dados

Análises Descritivas

As análises descritivas permitem identificar possíveis pares de variáveis para associação, além de viabilizar algumas inferências a partir da distribuição das respostas dos informantes aos itens do questionário. Os itens A1, A2 e A3 se referem a sexo, faixa etária e raça, respectivamente, e, a priori, não seriam foco de análises de distribuição, já que a proporção de respostas a cada um desses ítens foi pré-determinada pelo plano amostral. Apesar disso, vale a pena levantar algumas questões relativas à categoria “raça”, considerando o próprio plano amostral, que reflete as características demográficas dos dois municípios.

Lembramos que a presente pesquisa trabalhou com a perspectiva de “raça autodeclarada” da mesma forma que o Censo 2010. A consideração do critério da autodeclaração está de acordo com a mudança de paradigma que foca no reconhecimento da identidade e na ideia de que raça é uma experiência sócio cultural decorrente da escolha do indivíduo; e não algo a ser imposto por um terceiro. Obviamente a escolha pelo conceito de raça autodeclarada tem consequências. O Brasil é um país historicamente marcado por estrategias de branqueamento da população, processo iniciado ainda na colonização, quando a missigenação era incentivada sob o discurso de que “a raça seria melhorada” (ZAID, 2006).  Assim, sabemos que a autodeclaração não se forja num território racialmente neutro (ROCHA, 2005). O racismo influencia a forma como as pessoas enxergam e declaram sua identidade racial.

As tabelas 2 e 9 demonstram como as juventudes de Niterói e São Gonçalo, respectivamente, estão proporcionadas com relação à raça, segundo o critério da autodeclaração. Uma primeira observação que chama a atenção, apesar de não se relacionar diretamente aos objetivos da pesquisa, diz respeito à insignificância da população indígena. O grupo que se auto-declara indígena é bem inferior, inclusive, àquele que se autodeclara “amarelo”. Se considerarmos que o senso comum classifica como “amarelos” indivíduos com fenótipo típico dos orientais, concluiremos que imigrantes ou seus descendentes encontraram mais espaço social e simbólico no território de Niterói e São Gonçalo do que seus povos originários. E cabe ressaltar que a cidade de Niterói foi fundada a partir de uma aldeia indígena[1].

No que diz respeito aos jovens que se auto-declaram brancos, pretos ou pardos, percebemos em Niterói a predominância absoluta dos brancos. Eles são maioria em todos os estratos etários, e correspondem a 60,35% da população jovem. Já os pretos representam apenas 10,21% da juventude do município, e os pardos 28,6%. Somados, pretos e pardos (negros, portato) representam 38,37% da população jovem de Niterói. Em São Gonçalo os pretos entre 15 e 29 anos são igualmente minoria: 12,2% do total. Os pardos, no entanto, aparecem como grupo majoritário, representando 45% dos jovens do município. Juntos, pretos e pardos correspondem a 57,2% dos jovens de São Gonçalo. A população branca equivale a pouco menos de 42% da juventude do município.

Passamos a analisar as distribuições das respostas ao questionário. É importante resgatar o cálculo de erro amostral que – conforme detalhado no ponto 2.1– é, no geral, de 3,09 pontos percentuais para mais ou para menos, com 95% de confiabilidade. Essa margem de erro deve ser considerada nos resultados identificados nas análises descritivas que tiverem como universo os 1000 respondentes constituintes da amostra. Como já dito, nem todos os itens contarão com 1000 respostas já que algumas perguntas eram especificamente direcionadas aos jovens que já haviam trabalhado e outras, mais especificamente ainda, eram dirigidas aos jovens que se encontravam empregados no momento da entrevista. No caso desses itens o erro amostral  será maior.

Também sublinhamos que alguns dados foram perdidos (missing data). Algumas respostas não foram registradas em alguns questionários, ou por erro do entrevistador, por desconhecimento do informante, ou por sua recusa a responder. São poucos os dados perdidos e eles variam a depender do ítem analisado. Quando verificado missing data, as distribuições são calculadas em porcentagem tendo como referência o “N” (total de respostas) observado para o ítem. Nesses casos, sobretudo considerando o pequeno número de dados perdidos, não há alteração significativa do erro amostral.

Considerado esse contexto, a diferença na distribuição racial dos jovens de Niterói e de São Gonçalo deve ser sobreposta à análise da situação da renda familiar (item A4 – Gráfico 1).

 

Nas duas cidades temos a predominância de jovens com renda familiar entre 1 e 3 salários mínimos e, na sequência, com renda familiar entre 3 e 5 salários mínimos. De toda forma é notável uma renda maior em Niterói, onde 13,6% dos jovens informam que suas famílias vivem com 5 a 15 salários mínimos, enquanto em São Gonçalo esse grupo não chega a 2% dos informantes. No estrato mais pobre (renda familiar de 0 a 1 salário mínimo) observa-se uma diferença de 5,6 pontos percentuais para mais em São Gonçalo, enquanto no estrato mais rico (+15 salários mínimos), a diferença é de 1,8 ponto percentual para mais no município de Niterói. Na mesma direção, a soma dos dois estratos mais baixos (renda familiar de 0 a 3 salários mínimos) em Niterói equivale a 55,3% dos entrevistados, enquanto em São Gonçalo esse grupo representa 72,6% dos jovens.

Portanto, em São Gonçalo, onde a juventude é predominantemente negra (pretos + pardos), ela é também predominantemente mais pobre. Já em Niterói, onde a renda familiar é mais alta, a juventude é majoritariamente branca. Esses dados não são coincidência. Ao contrário refletem uma tendência nacional. De acordo com o IBGE, em 2015, entre os 1% mais rico da população brasileira, 79% era branco. Por outro lado, no grupo 10% mais pobre os negros são maioria, equivalendo a 73,2% do total (BRASIL, IBGE, 2015). Logo, o cenário observado em Niterói e São Gonçalo corrobora para a percepção de que, no Brasil, a distribuição das riquezas observa forte viés racial.

Produz alguma surpresa o dado de que mais da metade dos informantes de Niterói observe uma renda familiar máxima de 3 salários mínimos, considerando que a cidade é, de acordo com o IBGE, detentora da segunda maior renda per capita do país e a maior do estado do Rio de Janeiro (R$1.596,51, em 2010[2]).  Como é possível uma renda per capita tão alta, diante de um contingente tão grande de famílias com renda tão reduzida (até 3 salários mínimos)? Tal resultado está associado à desigualdade socioeconômica observada no município, que em 2010 registrou um índice de Gini[3] de 0,598, mais alto do que o índice geral do país que naquele momento era de 0,530[4]. Cabe destacar que, conforme apontam dados do Ministério da Saúde, o município de Niterói contraria a tendência nacional observada entre 1991 e 2010. Enquanto o Brasil reduziu seu índice de desigualdade econômica no período, Niterói vê esse esse indicador subir, passando de 0,577 em 1991, para 0,598 em 2010[5].

São Gonçalo é mais pobre, apresenta renda per capita muito mais baixa (R$639,00 em 20106), mas observa um cenário mais igualitário. O índice de Gini do município passou de 0,471, em 1991, para 0,430, em 20109. Inferior, portanto, ao índice nacional no mesmo ano, e observando tendência de redução da desigualdade econômica. O dado, embora positivo, pode ser também um indicador do viés racial na distribuição da riqueza: um município onde a maior parte da população é negra, mostra-se uniformemente mais pobre.

As duas variáveis cuja distribuição foi analisada na sequência se referem à escolaridade dos pais dos informantes. Estas variáveis, segundo a bibliografia, constituem uma proxy para aferição do nível socioeconômico do indivíduo. Os dados reforçam as diferenças entre Niterói e São Gonçalo. Em Niterói, a resposta mais frequente para a pergunta sobre a escolaridade da mãe é “ensino médio completo”, grupo que corresponde a 30% das respostas. Já somando as alternativas “ensino superior incompleto”, “ensino superior completo” e “pós graduação” teremos, em Niterói, 33,5% dos informantes. Ou seja, nesse município mais da metade dos jovens (63,5%) afirma que a mãe tem ensino médio completo ou mais.

Em São Gonçalo a resposta “ensino médio completo” também é a mais frequente, correspondendo a 42% das respostas. No entanto, somando “ensino superior incompleto”, “ensino superior completo” e “pós graduação”, alcançamos apenas 8,9% dos informantes. Já as alternativas “fundamental incompleto”, “fundamental completo” e “ensino médio incompleto”, somam 36,8% das respostas dos informantes de São Gonçalo. Ou seja, nesse município quase 80% dos jovens declara que a mãe tem, no máximo, ensino médio completo. O contingente de respostas relativas aos estratos mais baixos (“analfabeta” e “sabe ler e escrever”) são parecidos e pouco significativos nos dois municípios. (Gráficos 2 e 3).

 

Em relação à escolaridade paterna os dados são ainda mais discrepantes. Em São Gonçalo a maior parte dos respondentes (29,7%) declara que o pai tem “ensino médio completo”, enquanto em Niterói o maior número de respostas (23,5%) é “ensino superior completo”. A segunda resposta mais frequente em São Gonçalo, é “não sabe declarar” (25,2%). Um quarto dos jovens neste município não tem conhecimento da escolaridade do pai, o que indica o distanciamento ou mesmo a ausência da figura paterna. (Em ambos os casos haverá impacto sobre a vida do jovem e ou sobre a renda familiar). Em Niterói essa alternativa foi a opção de 14,8% dos informantes: ainda um índice elevado, embora 10 pontos percentuais a menos, em relação à São Gonçalo. A segunda resposta mais frequente em Niterói (22,3%) é “ensino médio completo”. (Gráficos 4 e 5)

 

Os jovens que declararam estar estudando no momento da entrevista (ítem B8) totalizam 42,1% dos respondentes em São Gonçalo e 57,3% em Niterói. Em relação aos que não estudam, as proporções se invertem: 57,8% dos informantes em São Gonçalo e 42,6% em Niterói (gráfico 6).

 

As amostras desenhadas para Niterói e São Gonçalo refletem as proporções observadas na população jovem de cada um dos dois municípios. Considerando que há pouca diferença no que diz respeito à distribuição etária dessas populações (como podemos verificar na comparação entre as tabelas 2 e 9), inferimos, a partir do gráfico 6, que os jovens de Niterói estudam por mais tempo. Esta percepção é corroborada pela distribuição das respostas do ítem que indaga sobre a escolaridade do jovem (gráficos 7 e 8).

 

Em São Gonçalo a resposta mais frequente é “ensino médio completo” (35,7% dos respondentes). Entretanto, apenas 14,2% declara ter “ensino superior incompleto”. Ou seja, poucos jovens que concluem o ensino médio em São Gonçalo ingressam no ensino superior. Já a categoria “ensino médio incompleto” é a resposta de 29,3% dos informantes. Considerando a faixa etária dos entrevistados (15 a 29 anos), esse dado é indicador de uma defasagem série-idade significativa no município. Reforça essa informação o fato de 10,6% de jovens de São Gonçalo declarar ainda estar cursando o ensino fundamental, etapa onde, idealmente, não haveriam indivíduos com mais de 15 anos.

Em Niterói a resposta mais frequente é “ensino superior incompleto” (30% das respostas) seguido de ensino médio completo (22,2%) e ensino médio incompleto (20,1%). Há uma distribuição mais equilibrada das respostas, o que pode significar menores índices de repetência e um fluxo escolar mais próximo do esperado. Corrobora para essa impressão o fato das respostas em Niterói estarem concentradas nas alternativas que correspondem à escolaridade esperada para a faixa etária abordada pela pesquisa (15 a 29 anos). Apenas 5,6% dos entrevistados em Niterói afirma estar cursando o ensino fundamental. Outra diferença entre os dois municípios é a proporção de jovens que declara ter pós-graduação. São 6,2% do total em Niterói contra apenas 0,7% em São Gonçalo. Todos os dados, portanto, fortalecem a percepção de que em Niterói a juventude alcança maior escolaridade.

Um dado positivo é a existência de apenas um informante (em São Gonçalo) que se declara analfabeto, e outro (em Niterói) que declara sabendo “ler e escrever”. Esse cenário reflete as estatísticas nacionais que apontam a acentuada redução do analfabetismo entre as novas gerações. A presente pesquisa também retrata esta tendência, apontando que é maior o número de analfabetos entre os adultos: são 41 pais/mães em Niterói e 30 em São Gonçalo. Do mesmo modo a categoria “sabe ler e escrever” se mostra mais frequente entre os pais e as mães: são 50 em cada um dos dois municípios.

Em São Gonçalo, 80,3% das respostas ao item B10 (“Já trabalhou”) foram afirmativas, enquanto 19,7% foram negativas. Em Niterói, 72,9% dos jovens entrevistados declararam já ter trabalhado. Identificamos entre as respostas afirmativas uma diferença de aproximadamente 7 pontos percentuais que aponta uma presença maior dos jovens de São Gonçalo no mercado de trabalho. (Gráfico 9).  Como já vimos, em Niterói, ao que parece, os jovens permanecem mais tempo dedicados aos estudos.

 

Analisando a distribuição das respostas do item B11, “Há quanto tempo trabalha” (gráfico 10) percebemos um contexto semelhante nos dois municípios, coincidindo as respostas mais frequentes: em primeiro lugar de 1 a 3 anos (21,1% dos informantes em São Gonçalo e 20,9% em Niterói), na sequência 3 a 5 anos (17,5% em São Gonçalo e 17,6% em Niterói), e em terceiro lugar 5 a 7 anos (15% em São Gonçalo e 12% em Niterói). A maior diferença está na frequência da resposta “mais de 7 anos”, que foi declarada por 13,1% dos entrevistados em São Gonçalo e por 9,5% dos entrevistados em Niterói. No gráfico 10, a categoria “não se aplica” se refere aos jovens que ainda não começaram a trabalhar.

 

Os dados levam a crer que em termos de ingresso e permanência no mercado de trabalho os dois municípios se equivalem, observando ligeira tendência de que o jovem em São Gonçalo comece a trabalhar mais cedo. Essa última percepção é fortalecida pela distribuição dos respondentes que se enquadram na categoria “não se aplica”. Eles correspondem a 20,6% em São Gonçalo e a 27,6% em Niterói. São os jovens que até o momento da coleta de dados jamais haviam trabalhado. Como se vê, o grupo é mais numeroso em Niterói.

O ítem B12 (“Trabalha atualmente?”), ilustrado pelo gráfico 11, nos permite aferir o nível de empregabilidade da juventude nos dois municípios. Para uma análise mais precisa é necessário cruzar os dados deste item com as respostas ao item B10 (“Já trabalhou?”).

 

Vejamos primeiro a situação de São Gonçalo. De acordo com as distribuições de respostas do item B10, nesse município 80,3% dos jovens entrevistados declarara já ter trabalhado em algum momento. Outros 19,7% jamais haviam trabalhado. Já considerando as respostas do item B12, 56,3% declarou estar trabalhando no momento da entrevista, 29,9% afirmou estar desempregado e para 13,8% esta pergunta não se aplica. Ou seja, embora 19,7% do total de entrevistados em São Gonçalo jamais tenha trabalhado, uma parte deste grupo (5,9%) já busca emprego, não tendo ainda conseguido inserção.

Ao todo, 86,2% dos entrevistados de São Gonçalo trabalha ou busca emprego. (80,3% dos jovens que já trabalharam somados aos 5,9% que nunca trabalhou, mas que já procura colocação). Entre os que trabalham ou buscam emprego, 29,9% está desempregado. Portanto, se partimos do pressuposto que a amostra é representativa da juventude de São Gonçalo, a taxa de desemprego corresponde à proporção de 29,9% de desempregados entre os 862 respondentes da amostra que já trabalharam ou que buscavam emprego no momento da entrevista. Teremos, dessa forma, um índice de desemprego de 34,7% entre os jovens de São Gonçalo, com margem de erro de 3 pontos percentuais para mais ou para menos. Trata-se de uma taxa, bastante superior à media nacional geral de 12,6%, aferida no último trimestre de 2017 pelo IBGE[6].

Seguimos o mesmo raciocínio para Niterói. Embora 27,1% dos entrevistados tenha declarado jamais ter trabalhado, o ítem B12 (“Trabalha atualmente?”) não se aplica apenas a  22% do total. Logo, entre os que nunca trabalharam alguns (5,1%) já buscam inserção. Somando este contingente ao total que já trabalhou (72,9% dos respondentes), temos que 78% dos jovens de Niterói estão inseridos no mercado de trabalho, o equivalente a 780 integrantes da amostra desenhada pare esse município. Por outro lado, 25,5% dos entrevistados afirma estar desempregado (o equivalente, na amostra, a 255 informantes). Este número corresponde a 32,7% do total de 780 jovens da amostra de Niterói que já se encontram inseridos no mercado de trabalho. Se a amostra é representativa, este será o índice de desemprego entre os jovens do município. Um índice igualmente acima da média nacional, e um pouco abaixo da taxa de desemprego da juventude em São Gonçalo.

Em relação ao vínculo empregatício, observamos que a maior parte dos jovens do território que trabalham (49,7% em São Gonçalo e 47,2% em Niterói) possui carteira assinada, o que é um dado positivo. A segunda resposta mais frequente é “autônomo informal”, nos dois municípios. Nessa categoria se enquadram atividades remuneradas sem o recolhimento de quaisquer impostos ou benefícios trabalhistas. A princípio foi incluida para contemplar camelôs, vendedores, prestadores informais de serviços. Entretanto durante a pesquisa constatamos que tal categoria se observa em vários setores da economia. Vendedores de farmácia, atendentes de padarias e mesmo jovens colaboradores de grandes empresas são muitas vezes empregados sem qualquer formalização do vínculo.

Enquadram-se como “autônomos informais” 29,8% dos jovens de São Gonçalo que trabalham, e 20,9% dos jovens de Niterói atuantes no mercado. A terceira resposta mais frequente é “estágios ou bolsas”, correspondente à situação de 7,1% dos jovens que trabalham em São Gonçalo e a 13,3% dos jovens que trabalham em Niterói. Considerando que o acesso a “estágios ou bolsas” pressupõe o indivíduo estar estudando, fica mais uma vez flagrante o fato de que em Niterói os jovens estudam por mais tempo. (Gráficos 12 e 13).

 

* Vide respostas do ítem B12.

Também considerando exclusivamente os jovens que estavam trabalhando no momento da entrevista, a maior parte está na iniciativa privada (84% em São Gonçalo e 77% em Niterói). No município de São Gonçalo o restante dos jovens se distribui de modo uniforme entre o setor doméstico (8,1%) e o setor público (7,8%). Em Niterói o contingente de jovens inserido no setor público é de 15,8%, quase o dobro em relação a São Gonçalo, e apenas 7% está no setor doméstico (gráfico 14).

 

Cruzando os resultados dessa análise descritiva com a anterior, perceberemos que o vínculo com a iniciativa privada não significa, sempre, melhores condições de trabalho ou vínculos estáveis. Ao redor de 80% dos jovens empregados nos dois municípios está no setor privado, mas 30% dos jovens de São Gonçalo e 21% dos jovens de Niterói atua como “autônomo informal”. Julgamos que entre os autônomos informais não estão os trabalhadores do setor público. De outro lado, temos apenas 8% dos jovens de São Gonçalo e 7% de Niterói no setor doméstico. Mesmo que todos os que estão empregados no setor doméstico tivessem vínculos precários (o que não é provável tendo em vista a regulamentação da legislação trabalhista específica para trabalhadores domésticos), teríamos um grande contingente de jovens que atuam como “autônomos informais” dentro da iniciativa privada.

Em relação à remuneração, os dois municípios apresentam realidades semelhantes. Tanto em um quanto em outro a maioria dos jovens empregados ganha entre 1 e 3 salários mínimos (50,6% em São Gonçalo e 49,3% em Niterói). A segunda resposta mais frequente é de 0 a 1 salário mínimo (44 % em São Gonçalo e 40,7% em Niterói). Uma pequena diferença aparece no contingente de jovens que recebe de 3 a 5 salários mínimos. Esse grupo corresponde a 4,3% em São Gonçalo e a 8,8% em Niterói. (Gráfico 15). No entanto, é possível concluir que a juventude é, de modo geral, mal remunerada, com quase a totalidade recebendo até 3 salários mínimos mensais nos dois municípios.

 

Apesar da baixa remuneração, a maior parte dos jovens se diz satisfeita ou muito satisfeita com seu emprego atual (60% em São Gonçalo e 68% em Niterói). Não se pode deixar de associar a alta frequência das respostas “satisfeito” e “muito satisfeito” ao contexto de crise econômica e desemprego, no qual “estar empregado” já é percebido como dado positivo. Declara estar insatisfeito ou muito insatisfeito com o emprego 20,3% dos jovens empregados de São Gonçalo e 16% dos jovens de Niterói. Os indiferentes representam 19,3% dos jovens de São Gonçalo e 15,8% dos jovens de Niterói, sempre considerando apenas aqueles que estavam trabalhando no momento da entrevista. (Gráficos 16 e 17)

 

* Vide respostas do ítem B12.

 

Ainda com relação ao bloco de perguntas sobre empregabilidade, cabe análise dos três itens sobre as políticas públicas para o setor. Os dados apontam que poucos jovens conhecem tais políticas e um número ainda menor faz uso delas. O item B9 indagava se o jovem já teria se utilizado de algum programa público de formação profissional ou estímulo à educação superior, tais como Pronatec, Projovem, FIES e Prouni.

Cabe uma breve descrição. O Pronatec[7] implica em formações de curto prazo, voltadas a estudantes do ensino médio da rede pública e beneficiários do programa Bolsa Família. O FIES[8] financia cursos superiores em faculdades privadas, com estorno do investimento pelo beneficiário, após concluída a graduação. Já o Prouni[9] distribui bolsas parciais ou integrais em faculdades particulares, para jovens de baixa renda familiar. O Projovem[10] é destinado a jovens que queiram concluir o ensino fundamental e obter um certificado profissionalizante. Em 2018 todos esses programas estavam ativos, sendo que o Projovem só estava disponível em 17 estados e 70 municípios, incluindo, no  estado do Rio de Janeiro, o município de São Gonçalo.

Em São Gonçalo 83% dos informantes disse jamais ter acionado quaisquer um desses programas, enquanto em Niterói a resposta negativa foi apresentada por 76% dos entrevistados (gráfico 18). Apesar da baixa renda familiar predominante entre os entrevistados nos dois municípios, ao que parece, tais políticas não se mostraram interessantes ou não chegaram ao seu conhecimento. Quando indagados sobre o Sistema Nacional de Empregos (SINE), através do item B19, o grau de conhecimento mostra-se um pouco melhor: 48% dos entrevistados em São Gonçalo e 44% em Niterói afirma conhecer o sistema (gráfico 19). De toda forma ainda é menos do que a metade dos jovens nos dois municípios.

 

O ítem B18 só foi dirigido aos jovens que já se encontravam inseridos no mercado de trabalho (que já haviam trabalhado ou estavam buscando emprego). Quando indagados se já haviam acionado alguma política pública para conseguir emprego 97% desses jovens em São Gonçalo e 77% dos jovens em Niterói disseram “não”. (Gráfico 20). Foi observado, durante a aplicação do questionário, uma dificuldade dos jovens em identificar tais “políticas públicas”. Muitos indagavam, por exemplo, se o “Centro Integração Empresa Escola (CIEE)”; um órgão privado – que oferece serviços gratuitos aos jovens – era uma “dessas políticas”. Nesses casos os informantes eram esclarecidos.

É possível supor, no entanto, que mesmo entre os que responderam afirmativamente ao ítem (ou seja, entre os que declararam que já usaram alguma política pública para buscar/ ou conseguir emprego) estivessem indivíduos que não soubessem identificar tais políticas. Assim podemos imaginar que o número de jovens que já acionou alguma política pública – como o SINE – para buscar/conseguir emprego pode ser ainda menor do que aponta a pesquisa. Outro dado que chama a atenção é a possibilidade de maior facilidade dos jovens de Niterói para acessarem tais políticas públicas de fomento à empregabilidade em comparação com São Gonçalo.

 

No que diz respeito à percepção do racismo no mundo do trabalho, observamos dados contraditórios. A maior parte dos entrevistados, nas duas cidades, concorda que existem profissões/trabalhos determinados pela cor da pele. O ítem C20 (“Você acha que determinados trabalhos/profissões são definidos pela cor da pele?”), foi aplicado ao conjunto de 1000 jovens entrevistados em cada município. A resposta “sim” foi dada por 64% dos informantes em Niterói e 67% destes em São Gonçalo. (Gráfico 21)

 

Já o ítem C21 (“A cor da sua pele influencia o tipo de emprego que você procura?”) foi aplicado apenas aos jovens já inseridos no mercado de trabalho (empregados, que já haviam trabalhado, ou procurando emprego). Essa pergunta, portanto, foi aplicada a um número menor de jovens, em relação ao ítem anterior. De todo modo, surpreende que, remetidos a uma situação pessoal, os informantes não manifestem a mesma percepção sobre o racismo: 82% dos respondentes de Niterói e 97% de São Gonçalo afirmam não considerar a cor de sua pele ao eleger as oportunidades às quais irão concorrer no mercado de trabalho, embora, como já visto antes, a maior parte identifique a segregação racial na divisão social dos trabalhos e funções.

 

** Cruzando as resposta dos itens B10 e B12 chegamos a 780 jovens em Niterói e a 862 jovens em São Gonçalo que trabalham ou buscam emprego.

 

A exemplo do ítem anterior, a pergunta C22 (“Na sua percepção, a cor da sua pele prejudica ou já prejudicou sua contratação em empregos?”) foi dirigida apenas aos jovens já inseridos no mercado de trabalho. Como resultado temos que, entre os jovens empregados ou em busca de emprego, 97% em São Gonçalo, e 82% em Niterói dizem que não. (Gráfico 23).

 

** Cruzando as resposta dos itens B10 e B12 chegamos a 780 jovens em Niterói e a 862 jovens em São Gonçalo que trabalham ou buscam emprego.

 

Em Niterói, como já observado, os negros (pretos e pardos) correspondem a apenas a 38,37% da população jovem. É de se esperar que os que sentem o preconceito/racismo como empecilho ao ingresso no mercado de trabalho estejam nesse grupo. Se os que respondem “sim” ao ítem C22 equivalem a 13% dos respondentes, teremos um contingente aproximado de 25% dos jovens negros que não identificam, nesse município, essa dificuldade, apesar da cor da sua pele. Podemos levantar a hipótese de que o jovem negro por ser, em sua maioria, pobre e com menor escolaridade, estará sempre buscando empregos que exigem menor qualificação e, por isso, socialmente “condizentes” com sua cor de pele. Ao disputar uma vaga como entregador de compras ou pedreiro, o jovem negro de fato não enfrentará o racismo como empecilho no processo seletivo.

No município de São Gonçalo 12,2% da juventude local se declara preta, e 45% parda. Portanto, negros somam mais de 57% do total de jovens nesse território. No entanto, apenas 11% dos entrevistados aponta o racismo como problema na hora da contratação em empregos. Como observamos em Niterói, podemos supor que haverá jovens tentando adequar sua busca de inserção ao contexto discriminatório. Isso os levará a não perceber o preconceito no momento da contratação. Mas, no caso de São Gonçalo, outra possível motivação pode se relacionar às restrições do mercado de trabalho no município, onde o PIB é menor, a população mais pobre e menos escolarizada. As vagas de trabalho disponíveis, portanto, podem exigir menor qualificação. Este cenário somado a uma oferta de mão de obra majoritariamente negra, tende a reduzir o preconceito racial no momento da inserção no mercado. De toda forma, seriam necessários novos dados para uma análise mais precisa.

Uma vez inseridos no Mercado de trabalho, os jovens em sua maioria afirmam não identificar situações de racismo no ambiente laboral. Na relação com colegas de trabalho, apenas 6,5% dos jovens de São Gonçalo e 9% dos jovens Niterói afirma perceber a cor da pele como um elemento dificultador (gráfico 24).

 

Quando indagados se a cor da pele interfere ou já interferiu na sua relação com superiores ou contratantes, o número de respostas afirmativas cresce: 9% em São Gonçalo e 14% em Niterói (gráfico 25). Em ambos os casos, verificamos um número pequeno dos que percebem o racismo, em comparação com o total de pretos e pardos nas duas populações, especialmente no caso de São Gonçalo. De toda forma, nota-se uma diferença significativa entre os dois municípios, denotando haver, em Niterói, maior percepção da desigualdade racial nas relações de trabalho.

 

***Vide respostas do ítem B10 (“já trabalhou?”).

 

Identificamos uma contradição na comparação entre as respostas dos itens C23 e C24, com as respostas do ítem C25 (“Você já sofreu situações de racismo, injúria racial ou discriminação no trabalho?”). Dentre os jovens que já trabalharam em Niterói, 1,7% afirma já ter sofrido esse tipo de violência. Já em São Gonçalo 19,5% dos jovens que já trabalharam dá a mesma resposta (gráfico 26).

 

***Vide respostas do ítem B10 (“já trabalhou?”).

 

Os números não se coadunam com aqueles observados nas distribuições dos itens imediatamente anteriores. Por exemplo: em São Gonçalo, se entre os jovens que já trabalharam, apenas 6,5% já percebeu o racismo nas relações com colegas de trabalho, e apenas 9% percebeu o mesmo em relação a superiores ou contratantes, como pode 19,5% afirmar já ter sofrido situação de racismo ou discriminação no ambiente laboral? Mesmo somando as proporções dos que percebem a discriminação entre colegas com os que percebem em relação a superiores, teríamos 14,5%: menos, portanto, do que o total de jovens que respondeu “sim” ao ítem C25. Nesse caso, se o racismo não se dá entre colegas, nem com relação aos patrões, a que tipo de situação de racismo os jovens estão se referindo? (Talvez com relação a clientes?)

Em Niterói acontece o oposto. Se 9% dos jovens que já trabalharam percebem a cor da pele como empecilho na relação com colegas de trabalho e 14% percebe o mesmo em relação a superiores e contratantes, como apenas 1,7% afirma já ter sofrido situação de preconceito, discriminação ou injúria racial no trabalho? Mais uma vez cabe aprofundamento da investigação na etapa qualitativa, pois as evidências nos permitem inferir uma dificuldade do jovem em reconhecer, nominar e ou assumir situações de racismo e ou discriminação racial no ambiente laboral.

Estatísticas de Associação.

As estatísticas de correlação podem evidenciar a existência de associação (ou não) entre duas variáveis sem que isso, no entanto, demonstre relações de causa e efeito. Aqui utilizaremos a estatística do qui-quadrado de Pearson para identificar a tendência de um informante que opta por determinada alternativa de resposta num ítem escolher determinada categoria de resposta em outro ítem. Por exemplo, em nossa pesquisa, identificamos a forte probabilidade de um jovem que escolheu a categoria “branco” no ítem “raça” (A2) escolher a resposta “não” para o ítem “Já sofreu preconceito, discriminação ou injúria racial no trabalho” (C25).

A partir do cálculo dessas estatísticas podemos identificar informações úteis para a invetigação da incidência do racismo sobre a empregabilidade dos jovens de Niterói e São Gonçalo. Como já dito anteriormente, foram analisadas, para cada cidade, 74 possíveis associações, com base nas questões de interesse da pesquisa. Após análise de significância, chegamos a 24 associações válidas para São Gonçalo e 27 para Niterói. O número maior de associações significativas para Niterói deve-se a uma maior contundência das questões raciais nesse município que é majoritariamente branco e – não coincidentemente – mais desigual do ponto de vista socioeconômico. Em São Gonçalo, muitas associações envolvendo a variável “raça” não foram validadas do ponto de vista da significância estatística.

Os critérios para determinar a significância das associações foram os seguintes:

  1. p-valor inferior a 0,05. O p-valor é uma medida de significância, que indica o limite que se toma como base para afirmar que um desvio é decorrente do acaso ou não. No caso da presente pesquisa, um p-valor de 0,05 indica que há apenas 5% de chance de que a associação identificada entre duas variáveis se deva ao acaso (GAUVREAU e PAGANO, 1994).
  2. As duas variáveis associadas não poderiam levar a contagens menores do que cinco em qualquer categoria de resposta, pois nesse caso não há informação suficiente para aplicação do teste do qui-quadrado de Pearson (MORETTIN e BUSSAB, W.O, 2000).

Lembramos que nem sempre as medida das associações identificadas na presente pesquisa são comparáveis – para que isso fosse possível, todos os itens do questionário deveriam ter recebido exatamente o mesmo número de respostas[11]. Podemos afirmar que, isoladamente, quanto menor o p-valor, tomando como ponto de partida a medida de 0,05, maior a significância da associação. Sob esse critério, verificamos que todas as associações consideradas possuem alta significância.

Tomemos por exemplo a associação entre as variáveis “raça” e “renda familiar” para Niterói (Tabela 22). Chegamos a um p-valor de 0,00000000000000000000212. Isso significa que existe praticamente 0% de probabilidade da resposta de um informante sobre sua renda familiar não estar relacionada a sua raça, em Niterói. Como números com grande quantidade de casas decimais (como é o caso do p-valor dessa associação) são de difícil transcrição, utilizamos nessas situações outra forma de notação, acrescentando ao lado de um número a inscrição “E-x”. Isso significa que o p-valor é igual ao número expresso; vezes 10, elevado a “–x”. No caso da associação apresentada na tabela 20, por exemplo, o p-valor seria 2,12E-23, indicando um algarismo com 23 casas decimais. Assim, para facilitar a interpretação, é preciso considerar, nesses casos, que quanto maior o número após o sinal negativo, maior a significância da associação.

Aqui buscaremos interpretar, dentre as associações validadas, algumas que aportam informações úteis para os objetivos da pesquisa. Todas as demais associações válidas, no entanto, são apresentadas no anexo 1. A interpretação das associações foi organizada em quatro blocos. No primeiro traçamos um desenho da presença dos jovens no mercado de trabalho de acordo com sua raça, faixa etária, vínculo empregatício e segmento de atuação nos dois municípios. No segundo bloco analisamos em seperado as questões de gênero, igualmente importantes para a pesquisa. No terceiro bloco analisamos a percepção dos jovens quanto ao racismo no universo laboral. Por fim, no último bloco, verificamos como a juventude de Niterói e São Gonçalo vem acessando (ou não) as políticas públicas que envolvem juventude e trabalho.

Para facilitar a interpretação, além das tabelas de contingência, apresentamos também tabelas de distribuição de proporções; nas quais são consideradas as somas dos valores (em porcentagem) indicados nas linhas ou nas colunas da tabela, a depender da variável em análise. Por exemplo, na tabela 15, as somas foram consideradas por coluna, já na tabela 25, as somas foram consideradas por linhas. Em todas as tabelas de proporção, a coluna ou a linha destacada em cinza refere-se às proporções em relação ao total de respostas obtidas para os dois itens em associação.

A partir das análises descritivas tomamos conhecimento que embora sejam 1000 jovens constituindo as amostras desenhadas tanto para Niterói, quanto para São Gonçalo, alguns itens não contam com esse quantitativo de respostas. Em função da aplicação da pergunta B10 (“Já trabalhou?”) sabemos que há, na amostra, 803 jovens que já trabalharam em São Gonçalo e 729 na mesma situação em Niterói. Já observando as respostas ao ítem B12 (“Trabalha no momento atual?”) sabemos que alguns jovens, embora nunca tenham trabalhado, já se encontram em busca de uma colocação. Esse grupo somado aos que já trabalharam correspondem aos indíviduos que de alguma estão inseridos no mercado de trabalho. Dentro das amostras eles equivalem a 780 jovens em Niterói e a 862 em São Gonçalo. Por fim, considerando apenas as respostas afirmativas para o ítem B12, saberemos que do total de entrevistados temos uma amostra de 525 jovens empregados em Niterói e de 563 em São Gonçalo. Ao realizarmos as associações, no entanto, há casos de perda de dados (missing data), pois um mesmo informante pode ter deixado de responder a um dos dois itens em associação, e nessa situação ele deixa de ser “contado”. Por isso, em alguns casos, a tabela de contingência não apresenta o total de respostas esperado para os itens em análise.

Um Retrato da Juventude no Mercado de Trabalho de Niterói e São Gonçalo

No Brasil, a taxa de desocupação entre os jovens é maior em comparação com os adultos. Enquanto o índice geral de desemprego do país foi aferido em 12,6% no último trimestre de 2017, a taxa de desocupação entre os jovens no mesmo período ficou em 29%, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)[12]. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) o desemprego entre jovens no Brasil atingiu em 2017 a sua maior taxa em 27 anos. Entre as mais de 190 economias avaliadas pela OIT, apenas 36 tem uma situação pior que a do Brasil para os jovens (OIT, 2017).

Em Niterói e São Gonçalo o desemprego da juventude é ainda maior do que este índice nacional, já bastante alto: 32,7% da juventude de Niterói e 34,7% da juventude de São Gonçalo está desempregada. Como base para comparação podemos citar que o desemprego entre jovens na Síria é de 30,6%, e no Haiti é de 34% (ibidem).

O desemprego é tanto maior quanto menor a idade. Em Niterói e São Gonçalo a faixa etária entre 15 e 19 anos é a mais atingida (tabelas 15 e 16). Embora esteja nesse grupo a maior parte dos jovens que apenas estuda, a taxa de desemprego só leva em consideração os jovens que já trabalharam ou que buscam emprego. Portanto, praticamente metade dos jovens de 15 a 19 anos, economicamente ativos, estão desempregados nos dois municípios. Possivelmente isso se deva ao fato de que, entre os jovens, este seja o grupo que acumula menor experiência e escolaridade.

Nos segmentos etários seguintes (20 a 24, e 25 a 29 anos), as taxas de ocupação crescem. De todo jeito, somente considerando o segmento “mais velho” isoladamente (25-29 anos) o índice de desemprego entre jovens de Niterói e São Gonçalo se aproxima da média nacional de desemprego para a juventude (29%).

 

Trabalha no momento atual x Faixa Etária

 

Tabela 15 – Niterói
QuiQuadrado27,9681902p-valor0,00000778

 

 15 a 1920 a 2425 a 29TOTAL
Sim75197248520
Não789092260
TOTAL153287340780
 15 a 1920 a 2425 a 29TOTAL
Sim49%69%73%67%
Não51%31%27%33%
TOTAL100%100%100%100,0%

 

Tabela 16 – São Gonçalo
Qui quadrado32,73725p-valor0,0000845
 15 a 1920 a 2425 a 29TOTAL
Sim94221248563
Não10197101299
TOTAL195318349862
 15 a 1920 a 2425 a 29TOTAL
Sim48%69%71%65,3%
Não52%31%29%34,7%
TOTAL100%100%100%100,0%

Analisando isoladamente os dados de Niterói, identificamos ainda a incidência do racismo sobre a taxa de ocupação dos jovens. Nesse município o desemprego é maior para aqueles que se autodeclaram pretos.  Associando a categoria “raça” e o ítem B12 (“Trabalha no momento atual?”), veremos que a taxa de desemprego entre brancos e pardos nesse município (32%) é pouco maior que a média nacional de desemprego para juventude, enquanto entre os pretos é de 46%: 14 pontos percentuais maior (tabela 17). Em São Gonçalo a associação entre raça e empregabilidade não foi significativa

 

Trabalha no momento atual x Raça

 

Tabela 17 – Niterói
QuiQuadrado6,205775p-valor0,044919  
 BrancoPretoPardoTOTAL
Sim31144165520
Não1453778260
TOTAL45681243780
 BrancoPretoPardoTOTAL 
Sim68%54%68%67% 
Não32%46%32%33% 
TOTAL100%100%100%100% 
         

Sublinhamos a diferença observada, em Niterói, na empregabilidade de pretos e pardos.  Ela nos remete ao conceito de “colorismo”. O termo foi usado pela primeira vez pela escritora Alice Walker no ensaio If the Present Looks Like the Past, What Does the Future Look Like?, que foi publicado no livro In Search of Our Mothers’ Garden em 1982.  Ao contrário do racismo, que se orienta na identificação do sujeito como pertencente a certa raça para exercer a discriminação, o colorismo se orienta somente pela cor da pele. Isso quer dizer que ainda que uma pessoa seja reconhecida como negra ou afrodescendente, a tonalidade de sua pele será decisiva para o tratamento que a sociedade dará a ela. Quanto mais pigmentada, maior a exclusão e a discriminação. Em acréscimo, o processo do colorismo muitas vezes impede que o indivíduo pardo se identifique como “negro” enfraquecendo a luta contra o preconceito e a desigualdade racial (DJOKIC, 2015).

A idade do jovem também influencia a forma como este se encontra inserido no mercado de trabalho. A correlação entre “faixa etária” e “vínculo empregatício” possui alta significância tanto com dados de Niterói, quanto com dados de São Gonçalo (tabelas 18 e 19). Com relação ao ítem “vínculo empregatício”, em função da baixa frequência de repostas observadas, as categorias “contrato temporário”, “funcionário público concursado” e “funcionário público comissionado” foram somadas às frequências da categoria “CLT”. Pelo mesmo motivo, as frequências nas categorias “autônomo com RPA” e “microempreendedor individual” foram somadas às respostas da categoria “Autônomo Informal”. Por fim as poucas repostas observadas na categoria “jovem aprendiz” foram somadas às respostas da categoria “Estágio ou bolsa”.

 

Faixa etária x Vínculo Empregatício

 

Tabela 18 – Niterói
QuiQuadrado38,9560663p-valor0,00000711
 15 a 1920 a 2425 a 29TOTAL
CLT22116167305
Estágio ou Bolsa18383490
Autônomo Informal374449130
TOTAL77198250525
 15 a 1920 a 2425 a 29TOTAL 
CLT28,6%58,5%66,8%58% 
Estágio ou Bolsa23,4%19,3%13,6%17,2% 
Autônomo Informal48%22,2%19,6%24,8% 
TOTAL100%100%100%100,0% 
          
Tabela 19 – São Gonçalo
Qui quadrado57,34462p-valor0,00000000105
 15 a 1920 a 2425 a 29TOTAL
CLT25131164320
Estágio ou Bolsa24271061
Autônomo Informal456374182
TOTAL94221248563
 15 a 2920 a 2425 a 29TOTAL
CLT26,6%59,3%66,2%56,9%
Estágio ou Bolsa25,5%12,2%4%10,8%
Autônomo Informal47,9%28,5%29,8%32,3%
TOTAL100%100%100%100,0%

Lembramos que o ítem B13 (“Qual seu vínculo empregatício?”) só foi aplicado aos jovens que estavam trabalhando no momento da coleta de dados. Logo, não são considerados nessa estatística aqueles que apenas estudam, ou que estão desempregados.

Os mais jovens – que como vimos são os mais atingidos pelo desemprego – são também os mais atingidos pela informalidade. Na faixa etária entre 15 e 19 anos cerca de 48% dos informantes em cada um dos municípios atua como “autônomo informal”, categoria que inclui camelôs, vendedores ambulantes, “biscateiros” ou mesmo trabalhadores de empresas; vinculados sem contrato e sem qualquer regramento da relação patrão/empregado, situação que identificamos como razoavelmente corriqueira, durante o processo de aplicação dos questionários. Ao que parece a pouca experiência e ou a pouca escolaridade – inerente à juventude – vem sendo acionada pelo mercado como argumento para submeter esse segmento social a condições precárias de trabalho.

Entre os jovens com idades entre 20 e 24 anos, nos dois municípios, mais da metade trabalha com carteira assinada e uma proporção menor (cerca de 22% em Niterói e 28% em São Gonçalo) atua como “autônomo informal”. Considerando o total geral de respondentes nos dois municípios, os jovens desse grupo são maioria entre bolsistas e estagiários, possivelmente por ser esta a faixa etária correspondente ao ensino superior, onde esse tipo de oportunidade (bolsas de pesquisa e extensão ou estágios) é mais comumente ofertado. De todo modo, em números absolutos, o contingente de estagiários/bolsistas é pequeno nos dois municípios, equivalendo a cerca de 17% do total de informantes empregados em Niterói e pouco mais de 10% em São Gonçalo.

Entre o grupo de idade mais elevada (25 a 29 anos) o maior contingente (cerca de 66% nos dois municípios) trabalha com carteira assinada e na sequência (19,6% em Niterói e 29% em São Gonçalo) atua como “autônomo informal”. Em Niterói, o grupo de jovens dessa faixa etária que atua como bolsista ou estagiário é praticamente duas vezes maior do que em São Gonçalo. Portanto parte dos jovens “mais velhos” de Niterói está vinculado a um curso superior. Já em São Gonçalo é maior o grupo dessa idade que abraça uma ocupação independente das condições a que tenha que se submeter. Num município mais pobre, com menos oportunidades, o avançar da idade pode tornar mais urgente a necessessidade de renda.

Cabe sublinhar que, no que diz respeito ao vínculo empregatício, no geral o maior contingente é de jovens trabalhando com carteira assinada: 58% do total de informantes em Niterói e 56,9% em São Gonçalo. Esse é um dado positivo. Na sequência, no entanto, estão os “autônomos informais”, que correspondem a um quarto do total de jovens empregados de Niterói e a 32,3% dos jovens empregados de São Gonçalo.

Notamos que em São Gonçalo o grupo de “autônomos informais” é aproximadamente sete pontos percentuais maior que em Niterói e se mostra mais volumoso em quaisquer uma das três faixas etárias consideradas. A diferença possivelmente se deve ao fato de que São Gonçalo possui uma economia mais frágil, com empresas empregadoras menos estruturadas[13]. Além disso a população é mais pobre, com consequente maior demanda por emprego, o que tende a colocar os trabalhadores em geral, e em especial os jovens, numa situação de vulnerabilidade em sua relação com o mercado. O menor contingente nos dois municípios, como já dito, é dos estagiários e bolsistas, dado que pode indicar, no geral, o pequeno número de jovens no território da pesquisa que acessa o ensino superior.

Em Niterói, como vimos, o desemprego incide mais fortemente sobre os pretos, o que não significa, no entanto, que os pardos estejam livres da discriminação. Embora, nesse município, o índice de desemprego dos pardos seja igual ao dos brancos, uma investigação mais aprofundada revela diferenças entre esses dois grupos (brancos e pardos). Veremos isso, por exemplo, ao associarmos a categoria “raça” com a pergunta B11 (há quanto tempo trabalha?). Tal associação se mostrou significativa tanto para Niterói quanto para São Gonçalo e considera apenas os jovens que já tiveram alguma vivência no mercado de trabalho (tabelas 20 e 21). Salientamos que este ítem – conforme explicitado para os respondentes dos questionários – se refere ao tempo decorrido desde que o jovem ingressou no mercado de trabalho, e não ao tempo observado em seu emprego atual.

  

Raça x Há quanto tempo trabalha?

 

Tabela 20 – São Gonçalo
Qui quadrado16,5583445081167p-valor0,035051
 BrancoPretoPardoTOTAL
<1521955126
1 a 37529112216
3 a 5941866178
5 a 7641473151
>7482064132
TOTAL333100370803
 BrancoPretoPardoTOTAL
<115,6%19%14,9%16%
1 a 322,5%29%30,3%26%
3 a 528,2%18%17,8%22%
5 a 719,2%14%19,7%19%
>714,4%20%17,3%16%
TOTAL100%100%100%100%

 

Tabela 21 – Niterói
QuiQuadrado37,32650223p-valor0,00001

 

 BrancoPretoPardoTOTAL
<193922124
1 a 31281766211
3 a 51111947177
5 a 7631642121
>735164596
TOTAL43077222729
 BrancoPretoPardoTOTAL
<121,6%11,6%9,9%17%
1 a 329,8%22,1%29,7%29%
3 a 525,8%24,7%21,2%24%
5 a 714,6%20,8%18,9%17%
>78,1%20,8%20,3%13%
TOTAL100%100%100%100%

Em São Gonçalo o cenário para jovens brancos, pretos e pardos é mais equilibrado. A maior parte dos brancos (28,2%) afirma estar no mercado de trabalho por um tempo entre 3 e 5 anos. Na sequência 22,5% trabalha por um período entre 1 e 3 anos, e 19,2% trabalha por um tempo entre entre 5 e 7 anos. A maior parte dos pardos (30,3%) começou a trabalhar há um período entre 1 e 3 anos, 19,7% entre 5 e 7 anos, e por fim quase 18% trabalha por um tempo entre 3 a 5 anos. Nesse município, proporcionalmente, há mais jovens pretos trabalhando há menos de um ano do que jovens brancos. No entanto, 20% dos jovens pretos e 17% dos jovens pardos trabalham há mais de 7 anos, enquanto esse contingente equivale a apenas 14% dos brancos. Podemos dizer que em São Gonçalo há mais negros trabalhando há mais tempo em comparação com os brancos.

Caracterizando um cenário de desigualdade mais radical, em Niterói o maior contingente de brancos (30%) trabalha há um período entre 1 e 3 anos. Na sequência 26% trabalha há um tempo entre 3 e 5 anos e 22% trabalha há menos de um ano. Os menores grupos, entre os brancos, se referem às alternativas de resposta correspondentes a tempos maiores de vida laboral: 15% tem trabalhado por um período de 5 a 7 anos, e 8% há mais de sete anos. Entre os pretos o maior contingente (25%) está no mercado de trabalho há um período entre 3 e 5 anos. No mais as respostas se distribuem de maneira quase igualitária entre as opções de 1 a 3 anos, 5 a 7 anos e mais de 7 anos. O menor grupo (cerca de 12%), entre os pretos, corresponde àqueles que trabalham há menos de um ano, portanto há menos tempo.

Como aconteceu no caso dos brancos, em Niterói os dois maiores grupos dos pardos se concentram nas respostas “1 a 3 anos” e “3 a 5 anos” com 30 e 21% das respostas respectivamente. As semelhanças, no entanto, terminam aí. De maneira oposta aos brancos, o menor grupo entre os pardos de Niterói, com 10% das respostas, trabalha há menos de um ano. Quase 40% dos respondentes pardos desse município trabalha por um período de 5 a 7 anos, ou por mais de sete anos.

Concluímos, portanto que os jovens negros de Niterói (pretos e pardos) ingressam antes no mercado de trabalho em comparação com os brancos, sendo que os pretos percebem, em sobreposição, uma maior dificuldade de inserção, observando taxa de desemprego maior. Os pardos em Niterói observam a mesma taxa de desemprego dos brancos, mas ingressam antes no mercado da mesma forma que os pretos. Além disso, pretos e pardos em Niterói são mais pobres, conforme identificamos ao interpretar a associação entre as variáveis “raça” e “renda familiar”, que se mostrou significativa apenas para Niterói (tabela 22).

 

Faixa de Renda Familiar x Raça

 

Tabela 22 – Niterói
QuiQuadrado119,4528583p-valor2,12E-23
 BrancoPretoPardoTOTAL
0 a 1493448131
1 a 321851152421
3 a 52051359277
>5133519157
TOTAL605103278986
 BrancoPretoPardoTOTAL
0 a 18%33%17,2%13,3%
1 a 336%49,5%55%42,7%
3 a 534%12,6%21%28%
>522%4,8%6,8%16%
TOTAL100%100%100%100%

Vale ressaltar que embora o questionário incluísse para o ítem A4 (renda familiar) a categoria de resposta “mais de 15 salários mínimos”, para viabilizar a associação dessa variável com outras, foram somadas as respostas atribuídas à alternativa “mais de 15 salários mínimos” com as respostas à alternativa “5 a 15 salários mínimos”.  Por isso, na tabela 22, que apresenta a associação entre raça e renda familiar em Niterói, a última alternativa de resposta é “mais de 5 salários mínimos”. Além disso, como observamos nas análises descritivas, 14 entrevistados não sabiam declarar sua renda familiar em Niterói. Estes foram desconsiderados na estatística de associação, gerando missing em relação ao universo de respostas.

Observando a associação propriamente dita, verificamos que a maior parte dos negros em Niterói vem de famílias mais pobres. Entre os pretos 83% declara renda familiar de até 3 salários mínimos, enquanto entre os pardos essa proporção é de 72%. Novamente identificamos a questão do colorismo, que coloca os pretos em situação ainda mais excludente, o que não significa que pardos se aproximem da situação de renda familiar dos jovens brancos, entre os quais 44% vem de famílias com renda de até 3 salários mínimos. Por outro lado, enquanto 22% dos brancos entrevistados em Niterói declara renda familiar de mais de 5 salários mínimos, essa alternativa de resposta foi escolhida por pouco menos de 5% dos pretos e 7% dos pardos.

Relacionando a interpretação dessa associação com a análise anterior, observamos que se os jovens negros de Niterói começam a trabalhar mais cedo isso se dá provavelmente por necessidade financeira, o que tende a lançá-los no mercado de trabalho em situação de vulnerabilidade. Precisando do emprego o jovem negro aceitará mais facilmente vínculos precários e baixos salários. Em acréscimo, o início da vida laboral muitas vezes se associa à evasão escolar, redundando em menos anos de estudo e em consequente redução das perspectivas de vida profissional. A ideia de redução da escolaridade da população negra em Niterói, em função de seu ingresso precoce no mercado de trabalho, é fortalecida pela análise da associação entre as variáveis “raça” (A2) e “escolaridade do jovem” (A7), conforme apresentado na tabela 23. Mais uma vez, essa associação – que envolve a variável raça – não se mostrou significativa para o município de São Gonçalo.

 

Escolaridade x Raça

 

Tabela 23 – Niterói
QuiQuadrado80p-valor1E-12
 Branco.Preto.PardoTotal
Fund. Incompl.2372959
Fund. Compl.19101241
Médio Incomp.1053370208
Médio Compl.1172381221
Superior Incompl.2162259297
Superior Compl.82521108
Pós Grad523762
TOTAL614103279996
 Branco.Preto.PardoTotal
Fund. Incompl.3,8%6,8%10,5%6%
Fund. Compl.3,1 %9,7%4,3%4,1%
Médio Incomp.17,1%32,0%25,0%20,9%
Médio Compl.19%22,3%29,0%22,2%
Superior Incompl.35,1%21,4%21,1%29,8%
Superior Compl.13,3%4,9%7,5%10,8%
Pós Grad8,5%2,9%2,5%6,2%
TOTAL100%100%100%100%

Percebemos que, em se tratando de escolaridade, em Niterói o maior contingente de jovens está entre o ensino médio incompleto e o ensino superior incompleto, o que é compatível com o segmento etário analisado (15 a 29 anos). Entretanto, observaremos que enquanto a maior parte dos brancos está cursando o ensino superior, a maior parte dos pretos está ainda cursando o ensino médio, e a maior parte dos pardos declara o ensino médio completo. Cabe salientar que a distribuição etária entre os jovens brancos, pretos e pardos entrevistados não observa grande diferença. Ou seja, os jovens pretos não estão majoritariamente cursando o ensino médio porque são mais jovens ou os brancos estão majoritariamente cursando o ensino superior porque são mais velhos. Trata-se, efetivamente, da incidência do viés racial sobre a escolaridade da juventude no município. Podemos supor que, ingressando mais cedo no mercado de trabalho, os jovens pretos e pardos tem mais dificuldade para seguir estudando, vivenciando mais a repetência e a evasão escolar.

Em relação às alternativas de resposta mais extremas, veremos também que enquanto 8,5% dos brancos entrevistados possui pós-graduação, esse grupo representa apenas 2,9% dos pretos e 2,5% dos pardos. Em compensação, só 3,8% dos brancos declara ainda estar cursando o ensino fundamental, enquanto essa é a realidade de 6,8% dos pretos e 10,5% dos pardos.  Cabe destacar que identificamos nesse ponto específico (escolaridade) um cenário onde; excepcionalmente; os pardos estão em situação mais desfavorável do que os pretos, o que vai de encontro a outros dados da pesquisa que reforçam a incidência do colorismo.

Ainda em Niterói a questão racial está fortemente relacionada ao segmento do mercado de trabalho onde o jovem se encontra inserido. Essa associação também não se mostrou significativa quando usando os dados de São Gonçalo. (Tabela 24)

 

Segmento do mercado em que trabalha x Raça

 

Tabela 24 – Niterói
QuiQuadrado25,80397p-valor0,00347
 BrancoPretoPardoTOTAL
Setor Doméstico981936
Iniciativa Privada24129129399
Serviço Público5871782
TOTAL30844165517
 BrancoPretoPardoTOTAL
Setor Doméstico3%18%12%7%
Iniciativa Privada78%66%78%77%
Serviço Público19%16%10%16%
TOTAL100%100%100%100%

Independente da raça, a maioria dos jovens trabalha na iniciativa privada. O setor doméstico, segmento socialmente desvalorizado, e apenas recentemente equiparado aos demais segmentos do mercado, no que diz respeito a direitos trabalhistas[14], incorpora majoritariamente os pardos, na sequência os pretos e por fim os brancos. Se observarmos que mais da metade da população jovem de Niterói é branca, saberemos que essa predominância dos negros do setor doméstico  evidencia o racismo na divisão social do trabalho.

No município de São Gonçalo, uma rara associação significativa envolvendo a variável “raça” é aquela que associa as categorias raciais ao vínculo empregatício experenciado pelos jovens. (Tabela 25).

Vínculo empregatício x Raça
Tabela 25 – São Gonçalo
Qui quadrado10,07119p-valor0,039245

 

 BrancoPretoPardoTOTAL
CLT13336151320
Estágio ou Bolsa33121661
Autônomo Informal752483182
TOTAL24172250563
 BrancoPretoPardoTOTAL
CLT41,6%11,2%47,2%100%
Estágio ou Bolsa54%19,8%26,2%100%
Autônomo Informal41,2%13,1%45,7%100%
TOTAL42,8%12,8%44,4%100%

Nas categorias “CLT” e “autônomo informal”, verificamos a reprodução das proporções demográficas de São Gonçalo: os pardos são maioria, seguidos por brancos e pretos. A exceção está na categoria de resposta “estágio ou bolsa”, em que predominam os brancos. Inferimos que mesmo no município de São Gonçalo, onde a maioria da população jovem é negra, e onde a situação socioeconômica da população é mais igualitária, existe maior facilidade para que os brancos acessem o ensino superior, onde oportunidades como bolsas e estágios são mais comuns. Essa realidade é nacional: de acordo com dados da PNAD Contínua, em 2015 a proporção de pretos e pardos no ensino superior brasileiro era de 12,8% do total de alunos, embora tenha duplicado desde 2005 quando foram iniciadas as políticas afirmativas (BRASIL, IBGE, 2017). Ao que parece, São Gonçalo reproduz esse cenário.

Questões de Gênero

Ainda que o objetivo principal da pesquisa esteja relacionado às questões raciais, as análises relativas à desigualdade de gênero são igualmente relevantes para esta investigação, tendo em vista o espaço que o conceito de interseccionalidade vem ganhando nas lutas por direitos humanos.

A interseccionalidade foi desenvolvida a partir da herança do Black Feminism, no início dos anos 1990, dentro de um quadro interdisciplinar, por pesquisadoras inglesas, norte-americanas, canadenses e alemãs. Trata-se do estudo da sobreposição de identidades sociais e sistemas relacionados de dominação ou discriminação. A interseccionalidade sustenta que as conceituações clássicas de opressão dentro da sociedade – como o racismo, o sexismo, a homofobia, entre outros – não agem independentemente. Ao contrário, essas opressões se inter-relacionam (HIRATA, 2014). Assim, se sobre os negros de modo geral incide o racismo, sobre as mulheres negras se sobrepõe a opressão do machismo, estabelecendo a demanda por uma análise específica das questões de gênero em associação com as questões de raça.

As associações envolvendo a variável “sexo” (A1) se mostraram significativas tanto com dados de Niterói, quanto com dados de São Gonçalo. Em relação à taxa de desemprego, por exemplo, verificamos que esta é maior entre as mulheres. Nos dois municípios, cerca de 40% das mulheres estão desocupadas, enquanto o desemprego alcança cerca de 30% dos homens. (tabelas 26 e 27).

 

Trabalha no momento atual x Sexo

 

Tabela 26 – Niterói
QuiQuadrado5,544559p-valor0,018538
 MasculinoFemininoTOTAL
Sim278242520
Não115145260
TOTAL393387780
 MasculinoFemininoTOTAL
Sim71%63%67%
Não29%37%33%
TOTAL100%100%100%

 

Tabela 27 – São Gonçalo
Qui quadrado11,9879p-valor0,000535

 

 MasculinoFemininoTOTAL
Sim299264563
Não121178299
TOTAL420442862
 MasculinoFemininoTOTAL
Sim71%60%65%
Não29%40%35%
TOTAL100%100%100%

 

Para aprofundar a análise, construímos tabelas de contingência cruzando raça, sexo e a variável B12 (“Trabalha no momento atual?”).  Esta análise está expressa nas tabelas 28 (Niterói) e 29 (São Gonçalo).

 

Trabalha no momento atual x Sexo x Raça

 

Tabela 28 – Niterói

 

 MasculinoFemininoTOTAL
SimNãoSimNão 
Branco1646414781456
Preto2515192281
Pardo89367642243
TOTAL278115242145780

 

 MasculinoFemininoTOTAL
SimNãoSimNão 
Branco72%28%64,5%35,5%58,5%
Preto62,5%37,5%46,3%53,7%10,4%
Pardo71,2%28,2%64,4%35,6%31,1%
TOTAL35,6%14,7%31%18,7%100%
Tabela 29 – São Gonçalo

 

 MasculinoFemininoTOTAL
SimNãoSimNão 
Branco1324710875362
Preto38153520108
Pardo1295912183392
TOTAL299121264178862

 

 MasculinoFemininoTOTAL
SimNãoSimNão 
Branco73,7%26,3%59%41%42%
Preto71,7%28,3%63,6%36,4%12,5%
Pardo68,6%31,4%59,3%40,7%45,5%
TOTAL34,8%14%30,6%20,6%100%

Em Niterói percebemos claramente a sobreposição das opressões de sexo e raça. Nesse município, o único grupo em que a parcela desempregada é maior do que a parcela empregada é o grupo das mulheres autodeclaradas pretas. Em todos os demais estratos a taxa de emprego é maior que a taxa de desocupação. A maior taxa de emprego em Niterói se observa entre os homens brancos. Na sequência entre os homens pardos. A seguir as mulheres brancas e as mulheres pardas. Só então chegamos à taxa de ocupação dos homens pretos e por último, como já citado, as mulheres pretas.

Identificamos na realidade de Niterói, mais uma vez, a incidência do colorismo, com homens e mulheres pretos em situação mais vulnerável do que homens e mulheres pardos. Na verdade, no que se refere a taxa de desemprego, entre pardos e brancos prevalece a questão da desigualdade de gênero, com homens pardos em posição mais favorável do que mulheres brancas (o índice de desocupação entre homens pardos é sete pontos percentuais menor do que entre mulheres brancas). Outro dado que reforça a prevalência da questão de gênero entre brancos e pardos em Niterói, no que diz respeito a desemprego, é o fato de que as mulheres brancas e pardas apresentam taxas iguais de ocupação.

Em São Gonçalo, a incidência da inter-relação entre raça e sexo não se apresenta tão forte, ao menos no que diz respeito ao desemprego. A taxa de ocupação entre as mulheres pretas, inclusive, é maior do que entre as mulheres brancas e pardas. O machismo, no entanto, está presente. A maior taxa de emprego, mais uma vez, se observa entre os homens brancos. Na sequência estão os homens pretos e a seguir os homens pardos. Só então chegamos às mulheres: primeiro as pretas, depois as pardas e por fim as brancas.

Considerando o cenário socioeconômico de São Gonçalo, onde predominam empregos menos qualificados e remunerados, podemos compreender a maior taxa de emprego entre mulheres pretas – sobre as brancas – por exemplo, como resultado da necessidade financeira, que as leva a aceitar qualquer trabalho. De outro lado, se considerarmos a possível tendência de que as famílias brancas tenham maior renda (tendo por referência o cenário nacional) podemos levantar a hipótese de que parte das mulheres jovens e brancas de São Gonçalo assumem o cuidado com a casa e com os filhos, na ausência da necessidade premente de contribuir com o orçamento familiar. Essa são hipóteses que carecem de maior investigação.

Na sequência nos debruçamos sobre as diferentes experiências de homens e mulheres no que se refere ao segmento de mercado em que se encontram inseridos. As estatísticas de associação entre sexo (A1) e segmento de mercado (B15) se mostraram significativas tanto para Niterói, quanto para São Gonçalo. As mulheres ainda são maioria no setor doméstico, o mais desvalorizado do ponto de vista social. O sexo feminino representa 78% desse setor em Niterói e 87% em São Gonçalo. Na iniciativa privada e no serviço público os homens são maioria. (Tabelas 30 e 31).

 

Segmento do mercado em que trabalha x Sexo

 

Tabela 30 – Niterói
QuiQuadrado15,5003531p-valor0,000431
 MasculinoFemininoTOTAL
S.Doméstico82836
Iniciativa Privada225174399
Serviço Público443882
TOTAL277240517
 MasculinoFemininoTOTAL
S.Doméstico22%78%100%
Iniciativa Privada56%44%100%
Serviço Público54%46%100%
TOTAL54%46%100%
Tabela 31 – São Gonçalo
Qui quadrado32,84371p-valor7,38E-08
 MasculinoFemininoTOTAL
S.Doméstico64046
Iniciativa Privada268204472
Serviço Público261844
TOTAL300262562
 MasculinoFemininoTOTAL
S.Doméstico13%87%100%
Iniciativa Privada57%43%100%
Serviço Público59%41%100%
TOTAL53%47%100%

Cruzando, através de tabelas de contingência, as variáveis sexo, raça e o ítem B15, evidenciamos novas possibilidades de interpretação (tabelas 32 e 33).

 

Segmento do Mercado em que Trabalha x Sexo x Raça

 

Tabela 32 – Niterói

 

 MasculinoFemininoTOTAL 
BRPRPRDBRPRPRD 
Setor doméstico323661636
Inciativa privada1302075111954399
Setor Público30311284682
TOTAL16325891451976517

 

 MasculinoFemininoTOTAL
BRPRPRDBRPRPRD
Setor doméstico8,3%5,6%8,3%16,7%16,7%44,4%100%
Inciativa privada32,6%5%18,8%27,8%2,2%13,5%100%
Setor Público36,6%3,6%13,4%34,1%4,9%7,3%100%
TOTAL31,5%4,8%17,2%28%3,7%14,7%100%
Tabela 33 – São Gonçalo

  

 MasculinoFemininoTOTAL 
BRPRPRDBRPRPRD 
Setor doméstico2041252346
Inciativa privada12134113852792472
Setor Público10412102644
TOTAL1333812910734121562
 MasculinoFemininoTOTAL
BRPRPRDBRPRPRD
Setor doméstico4,3%0%8,7%26%11%50%100%
Inciativa privada25,6%7,2%23,9%18%5,7%19,5%100%
pSetor Público22,7%9,1%27,3%22,7%4,6%13,6%100%
TOTAL23,8%6,7%23%19%6%21,5%100%

O setor doméstico é, de fato, essencialmente feminino. Entretanto também observa, em sobreposição, um viés racial. Somando pretas e pardas em Niterói e São Gonçalo, mais de 60% dos trabalhadores domésticos nos dois municípios são mulheres negras. Para melhor interpretação desse dado, no entanto, devemos comparar as proporções aferidas com o mapa demográfico dos dois municípios.

A partir da observação da tabela 2 sabemos que a população jovem de Niterói é constituída por 40% de mulheres brancas, 14,3% de pardas e 5,2% de pretas (Outros 40,5% da população jovem de Niterói são homens). Se considerarmos esses números, veremos que a divisão do segmento doméstico entre mulheres das diferentes raças é desproporcional. Quase metade (44,4%) do setor é ocupado pelas mulheres pardas que, no entanto, não chegam a 20% da população jovem do município. Existe a mesma proporção de mulheres brancas e pretas no setor doméstico, ainda que na população como um todo a quantidade de mulheres brancas seja quatro vezes maior do que a quantidade de mulheres pretas. Assim fica claro o entendimento social – em Niterói – de que o trabalho doméstico é uma atribuição não só de mulheres, como de mulheres negras.

Seguiremos o mesmo raciocínio para analisar a composição do setor doméstico em São Gonçalo. A partir da tabela 9 aferimos que 23,7% dos jovens gonçalenses são mulheres pardas, 21,6% são mulheres brancas e 6,3% são mulheres pretas. No entanto, 50% dos que atuam no setor doméstico nesse município são mulheres pardas e 11% são mulheres pretas. Logo, estão inseridas no setor doméstico praticamente o dobro da proporção que esses dois grupos raciais representam na população jovem total de São Gonçalo. A proporção de mulheres brancas no setor é de 26%, também um pouco mais do que elas representam na população total. Portatanto, em São Gonçalo o trabalho doméstico é entendido, sobretudo, como uma atribuição de mulheres. As negras estão em desvantagem, mas as brancas também estão super-representadas no setor.

Analisamos agora a iniciativa privada. Este segmento em Niterói está majoritariamente ocupado por homens e mulheres brancos: eles correspondem a mais de 60% dos trabalhadores do setor. Entretanto, essa é a proporção de brancos na população jovem de Niterói. Portanto é de esperar a predominância dessa categoria racial – nessa medida – em qualquer segmento do mercado nesse município. A proporção de pardos (homens e mulheres) que atuam na iniciativa privada em Niterói também se aproxima da proporção dos que assim se autodeclaram na população como um todo. Só a proporção de pretos é menor do que deveria ser, provavelmente porque estes estão principalmente no setor doméstico. Do ponto de vista do sexo, a maioria dos jovens que compõem o setor privado, independente de raça, são homens. Isso também devido à maior presença das mulheres no setor doméstico (incluindo as brancas).

Já em São Gonçalo metade dos trabalhadores da iniciativa privada são homens brancos e pardos.  Ambos os grupos estão representados no setor privado em proporção maior do que aparecem na população jovem gonçalense. Isso se dá a custo da sub-representação das mulheres, tanto brancas quanto negras no setor. Como em Niterói, as mulheres aparecem menos na iniciativa privada principalmente por serem maioria no setor doméstico. A situação se repete no setor público, com maior presença de brancos e de homens nos dois municípios.

A variável “vínculo empregatício” se mostrou igualmente associada ao sexo dos informantes (tabelas 34 e 35). Em Niterói as mulheres são maioria entre os estagiários e bolsistas, possivelmente por serem maioria no ensino superior[15], tal qual se observa no paíse como um todo. Em compensação existem 8% menos trabalhadoras com carteira assinada, em relação aos homens, que são igualmente maioria entre os autônomos informais. Em São Gonçalo a distribuição é mais equânime nas categorias “CLT” e “estágio e bolsas”. Na categoria “autônomo informal” os homens voltam a ser maioria.

 

Vínculo empregatício x Sexo

 

Tabela 34 – Niterói
QuiQuadrado11,07141p-valor0,003943
 MasculinoFemininoTOTAL
CLT164141305
Estágio ou Bolsa355590
Autônomo Informal8050130
TOTAL279246525
 MasculinoFemininoTOTAL
CLT54%46%100%
Estágio ou Bolsa39%61%100%
Autônomo Informal62%38%100%
TOTAL53%47%100%

 

Tabela 35 – São Gonçalo
QuiQuadrado8,370793p-valor0,015216

 

 MasculinoFemininoTOTAL
CLT157163320
Estágio ou Bolsa303161
Autônomo Informal11369182
TOTAL300263563
 MasculinoFemininoTOTAL
CLT49%51%100%
Estágio ou Bolsa49%51%100%
Autônomo Informal62%38%100%
TOTAL53%47%100

 

A principal reflexão refere-se à predominância do sexo masculino no grupo dos “autônomos informais”. Poderíamos imaginar que, por se tratar de um vínculo precário, em alguns casos submetido a situações de insegurança (caso dos camelôs ou motoristas de uber, por exemplo), pareça mais fácil aos homens, do que às mulheres, assumir tais posições. Essa lógica não deixa de guardar um viés machista.

Cruzando as variáveis sexo X raça e vínculo trabalhista percebemos que em Niterói os pardos, tanto mulheres quanto homens são a maior parte dos autônomos informais. Já em São Gonçalo, considerando as três raças, os homens são sempre maioria nessa categoria de resposta.

 

Vínculo empregatício X Raça X Sexo

 

Tabela 36 – Niterói

 

 MasculinoFemininoTOTAL 
BRPRPRDBRPRPRD 
CLT981749871242305
Estágio ou bolsa231114131190
Autônomo Informal4373022424130
TOTAL16425901501977525
 MasculinoFemininoTOTAL
BRPRPRDBRPRPRD
CLT59,8%68%54,4%58%63,2%54,5%58,1%
Estágio ou bolsa14%4%12,2%27,3%15,8%14,3%17,1%
Autônomo Informal26,2%28%33,4%14,7%21%31,2%24,8%
TOTAL100%100%100%100%100%100%100%

 

Tabela 37 – São Gonçalo

 

 MasculinoFemininoTOTAL 
BRPRPRDBRPRPRD 
CLT662071671680320
Estágio ou bolsa1758167861
Autônomo Informal501350251133182
TOTAL1333812910834121563
 MasculinoFemininoTOTAL
BRPRPRDBRPRPRD
CLT49,6%52,6%55%62%63,2%66,1%56,8%
Estágio ou bolsa12,8%13,2%6,2%14,9%15,8%6,6%10,8%
Autônomo Informal37,6%34,2%38,8%23,1%21%27,3%32,3%
TOTAL100%100%100%100%100%100%100%

Em Niterói 50% dos jovens que declararam o vínculo “autônomo informal” (o mais precário) são pretos ou pardos. Considerando que os negros correspondem a pouco mais de 38% da população jovem de Niterói, fica evidente que há desigualdadede entre negros e brancos, no acesso a oportunidades regulares de trabalho. Em São Gonçalo, como já dito, os homens são maioria entre os autônomos informais, independente da raça. Face a uma população majoritariamente negra, ao que parece, as questões raciais se diluem, exercendo menos pressão sobre a empregabilidade da juventude e sublinhando as desigualdades de gênero.

 

Percepção dos Jovens sobre o Racismo no Mercado de Trabalho

As associações que abordam a percepção dos jovens sobre o racismo no mercado de trabalho evolvem os ítens do bloco “C” do questionário aplicado pela pesquisa.  Vejamos, de início, a associação entre “raça” (item A2) e a vivência de situações de racismo, discriminação ou injúria racial (item C25). Cabe salientar que essa pergunta foi dirigida especificamente aos jovens que já haviam trabalhado nos dois municípios (729 em Niterói e 803 em São Gonçalo).

A associação está expressa nas tabelas 38 e 39 e se mostrou significativa tanto em Niterói quanto em São Gonçalo. Em alguma medida é uma informação um tanto óbvia a de que a cor da pele se relaciona com o fato do jovem se perceber vítima, ou não, desse tipo de violência. O dado de interesse, no entanto, advém da constatação de que as situações de preconceito, discriminação ou injúria racial no ambiente de trabalho estão acontecendo, tanto em Niterói quanto em São Gonçalo, e que, de fato, incidem sobre a juventude.

 

Raça / Já sofreu situações de racismo, injúria racial ou discriminação no trabalho

 

Tabela 38 – Niterói
QuiQuadrado212,8980201p-valor = 5,89E-47
 SimNãoTOTAL
Branco7439446
Preto352661
Pardo66156222
TOTAL108621729
 SimNãoTOTAL
Branco1,6%98,4%100%
Preto57,4%42,6%100%
Pardo29,7%70,3%100%
TOTAL14,8%85,2%100%

 

Tabela 39 – São Gonçalo
Qui Quadrado158,3509p-valor4,12E-35

 

 SimNãoTOTAL
Branco12328340
Preto5347100
Pardo92271363
TOTAL157646803
 SimNãoTOTAL
Branco3,5%96,5%100%
Preto53%47%100%
Pardo25,3%74,7%100%
TOTAL19,5%80,5%100%

Em Niterói, praticamente a totalidade dos brancos (98,4%) jamais sofreu situações de preconceito, discriminação ou injúria racial no trabalho, enquanto 57,4% dos pretos e 29,7% dos pardos declara ter vivenciado essa experiência. Em São Gonçalo, 3,5% dos brancos sofreu situações de racismo, discriminação ou injúria racial no trabalho, enquanto esta é a realidade de 53% dos pretos e de 25,3% dos pardos. Embora a tendência nas distribuições seja a mesma para os dois municípios, os dados de Niterói evidenciam um racismo mais acentuado em relação a São Gonçalo, uma vez que é maior a proporção tanto de pretos quanto de pardos que relata ter vivido situações de racismo no ambiente laboral.

Outro dado a ser observado nos dois municípios é a diferença entre o contingente de pretos e de pardos que declara ter vivenciado situações de preconceito ou discriminação no trabalho. Enquanto mais da metade dos pretos em Niterói e em São Gonçalo respondeu afirmativamente à pergunta C25, no caso dos pardos esse contingente não chega à metade, alcançando 25,3% do grupo em São Gonçalo e 29,7% em Niterói. Mais uma vez nos deparamos com a questão do colorismo. Entretanto, embora o número de pardos que afirme ter vivido situações de racismo no trabalho seja menor que o número de pretos, ele é muito maior do que o “quase nada” de brancos que declara ter experienciado o problema.

Os dados também suscitam a dúvida sobre o tipo de discriminação, preconceito ou injúria racial apontado pelos brancos. A questão traz à tona a polêmica do chamado “racismo reverso”, termo usado para descrever atos de discriminação e preconceito perpetrados por minorias raciais, historicamente oprimidas, contra indivíduos pertencentes a grupos historicamente dominantes. O termo surge nos Estados Unidos no contexto do movimento pelos direitos civis dos negros. Na época era mais frequente o uso de “racismo negro”. O discurso do racismo reverso torna-se mais claro após a década de 1970, especialmentente como reação às políticas de ações afirmativas (DOUGLAS e da SILVA, 2017).

Para Douglas e Silva (2017) o termo racismo reverso não se justifica, porque, segundo os autores, qualquer forma de racismo é simplesmente “racismo”. Segundo eles a estrutura social não é a única possível expressão do racismo, abrindo espaço para a possibilidade do preconceito contra brancos, praticado por negros. Entretanto, ainda que um branco possa ser vítima de racismo, diferente dos negros ele continuará vivenciando de modo favorável o funcionamento da sociedade. O racismo não irá interferir na forma como o jovem branco projeta sua própria vida, ou como coloca em prática esse projeto. De toda maneira, a proporção de brancos que responde afirmativamente à pergunta C25 é mínima, em comparação com pretos e pardos.

No caso de Niterói a vivência pelos jovens negros da violência racial no ambiente de trabalho é corroborada pela alta significância das associações entre a categoria “raça” e as perguntas C23 (“a cor da sua pele interfere ou já interferiu em sua relação com colegas de trabalho?”) e C24 (“a cor da sua pele interfere ou já interferiu em sua relação com superiores ou contratantes?”). (Tabelas 40 e 41). Utilizando dados de São Gonçalo, essas duas associações não se mostraram significativas.

 

Raça x A cor da pele interfere ou já interferiu na relação com colegas de trabalho
Tabela 40 – Niterói
QuiQuadrado52,44347344p-valor4,09E-12

 

 SimNãoTOTAL
Branco22425447
Preto194059
Pardo25198223
TOTAL66663729
 SimNãoTOTAL
Branco5%95%100%
Preto32,2%67,8%100%
Pardo11,2%88,8%100%
TOTAL9%91%100%
Raça x A cor da pele já interferiu na relação com superiores no trabalho ou contratantes
Tabela 41 – Niterói
QuiQuadrado40,95359102p-valor0,000000128

 

 SimNãoTOTAL
Branco38408446
Preto214061
Pardo44178222
TOTAL103626729
 SimNãoTOTAL
Branco8,5%91,5%100%
Preto34,4%65,6%100%
Pardo19,8%80,2%100%
TOTAL14,1%85,9%100%

A tendência na distribuição das respostas é a mesma para os dois itens (C23 e C24). Os pretos, como é de se esperar são os que mais sentem o racismo: 32,2% desse grupo declara já ter tido problemas com colegas de trabalho por conta da cor da pele, e 34,4% observa a mesma questão com relação a superiores ou contratantes. Entre os pardos 11,2% já percebeu a influência do racismo na relação com colegas de trabalho e 19,8% na relação com os patrões. Entre os brancos a proporção é expressivamente menor: 5% identifica a cor da sua pele como causa de problemas com colegas de trabalho, e 8,5% identifica a mesma situação com relação a superiores.

Em primeiro lugar sublinhamos a maior proporção de jovens que indicam problemas relacionados ao racismo com os superiores, em comparação com os colegas de trabalho. Podemos supor, nesse caso, que; sobretudo entre jovens; os problemas com superiores ou contratantes serão sempre percebidos mais intensamente por gerarem maiores consequências/incômodos, em comparação com a maior parte dos problemas ocorridos com os colegas de trabalho.

Passamos então a explorar algumas contradições, usando dados de Niterói, já que as associações entre raça e os itens C23 e C24 não se mostraram significativos para São Gonçalo.  Em Niterói 57,4% dos pretos e 29,7% dos pardos declarou já ter sofrido situações de racismo no ambiente laboral. No entanto, o contingente de pretos que declara ter tido problemas com colegas ou superiores gira em torno de 30%. Entre os pardos, menos de 20% observa problemas de racismo em relação aos patrões ou superiores e um grupo ainda menor (11%) identifica a cor da própria pele como causa de problemas com colegas.

Uma hipótese para explicar a diferença seria uma concentração maior dos casos de preconceito, discriminação ou injúria racial no ambiente de trabalho originados da relação com terceiros (clientes, por exemplo). Outra possibilidade seria a dificuldade dos jovens em detalhar ou especificar o preconceito sofrido. Seria mais fácil assumir-se vítima do racismo de modo geral, do que em situações específicas.

Na direção oposta, 5% dos brancos de Niterói percebem a cor da sua pele como obstáculo na relação com colegas de trabalho e 8,5% identifica o mesmo problema em relação aos superiores. Entretanto, nesse município, apenas 1,5% desse grupo racial afirma ter sofrido preconceito ou discriminação racial no ambiente laboral. No caso dos brancos é possível que ao se referirem a problemas com colegas ou superiores em função de sua cor da pele, estejam mencionando o próprio preconceito (em relação ao “outro” negro), e não um racismo do qual tenham sido vítima. Outra possibilidade é a de que apesar de identificarem problemas com colegas ou superiores por causa da cor da pele, estes jovens não se enxerguem como possíveis vítimas de racismo e, portanto, não identificam essas dificuldades como tal.

Outras análises de associação permitem inferir que as situações de preconceito, discriminação ou injúria racial não acontecem de maneira idêntica em todos os segmentos do mercado de trabalho, sendo mais comumente observada no setor doméstico. A associação entre os itens B15 (qual segmento do mercado você trabalha?) e C25 (Já sofreu situações de racismo, injúria racial ou discriminação no trabalho?) se mostrou significativa para os dois municípios (tabelas 42 e 43). Lembrando que essas associações têm como universo o conjunto de jovens que se encontravam trabalhando no momento das entrevistas.

 

Segmento do mercado em que trabalha / Já sofreu situações de racismo, injúria racial ou discriminação no trabalho.

 

Tabela 42 – Niterói
QuiQuadrado16,31814914p-valor0,000286

 

 SimNãoTOTAL
Setor Doméstico162036
Iniciativa Privada71326397
Serviço Público127082
TOTAL99416515
 SimNãoTOTAL
Setor Doméstico44%56%100%
Iniciativa Privada18%82%100%
Serviço Público15%85%100%
TOTAL19%81%100%
Tabela 43 – São Gonçalo
Qui quadrado7,8487444921p-valor0,019755
 SimNãoTOTAL
Setor Doméstico182846
Iniciativa Privada102369471
Serviço Público83644
TOTAL128433561
 SimNãoTOTAL
Setor Doméstico39%61%100%
Iniciativa Privada22%78%100%
Serviço Público18%82%100%
TOTAL23%77%100%

Em Niterói, 44% dos jovens empregados no setor doméstico declaram já ter vivenciado situações de racismo ou discriminação no trabalho, enquanto a mesma experiência é declarada por 18% daqueles empregados na iniciativa privada e por 15% dos que atuam no serviço público. Em São Gonçalo 39% dos jovens atuantes no segmento doméstico apontam ter vivido situações de preconceito ou discriminação, contra 22% dos que trabalham na iniciativa privada e 18% dos que atuam no serviço público.

Devemos considerar também que, como já foi analisado, pelo menos em Niterói, o setor doméstico concentra maior contingente de jovens negros (tabela 23), e isso pode explicar porque as situações de racismo são mais frequentes nesse segmento. Além disso podemos inferir que o ambiente doméstico expõe mais o jovem à situações de violência racial, em função da dificuldade de fiscalização imposta pelo princípio constitucional da “inviolabilidade do lar”.

O resultado dessas asssociações também reforça a contradição observada em Niterói na distribuição das respostas entre as perguntas C25, C24 e C23, já abordada anteriormente. A concentração das situações de racismo identificadas pelos jovens no setor doméstico enfraquece a hipótese de que o racismo no trabalho, para os negros, poderia se concentrar na relação a terceiros, como clientes por exemplo. Isso porque o trabalho doméstico acontece no interior das residências, restringindo as relações do trabalhador, na maior parte do tempo, aos patrões e eventuais colegas. Observamos ainda que em Niterói a incidência das situações de racismo no setor doméstico é cinco pontos percentuais maior do que em São Gonçalo.

Considerando os segmentos “iniciativa privada” e “setor público”, a proporção de casos de racismo em Niterói é menor do que em São Gonçalo (quatro e três pontos percentuais para menos, respectivamente). Mas também como já observamos, em Niterói a proporção de brancos nesses dois segmentos de mercado é maior de que em São Gonçalo, como pudemos constatar ao analisar as tabelas 32 e 33. Na iniciativa privada, em Niterói temos 60,4% dos trabalhadores brancos, enquanto em São Gonçalo essa proporção é de 43,6%. No serviço público, enquanto em Niterói mais de 70% dos trabalhadores são brancos, em São Gonçalo esse número gira em torno de 45%.

Aparece como significativa, para os dois municípios, a associação entre as variáveis faixa etária e a vivência de situações de racismo, preconceito ou injúria racial (tabelas 44 e 45). Como essas associações não discriminam os informantes por raça, é esperado que a proporção de jovens que identifica situações de racismo seja pequena em relação ao total. Sobretudo em Niterói, onde a maior parte dos jovens se autodeclara branco.

 

Faixa Etária x Já sofreu situações de racismo
Tabela 44 – Niterói
QuiQuadrado7,867946965p-valor0,019565774

 

 SimNãoTOTAL
15 a 2919163182
20 a 2450209259
25 a 2939249288
TOTAL108621729
 SimNãoTOTAL
15 a 2910,4%89,6%100%
20 a 2419,3%80,7%100%
25 a 2913,5%86,5%100%
TOTAL14,8%85,2%100,0%
Tabela 45 – São Gonçalo
Qui quadrado21,75535p-valor0,00189
 SimNãoTOTAL
15 a 2928202230
20 a 2449225274
25 a 2980219299
TOTAL157646803
 SimNãoTOTAL
15 a 2912,2%87,8%100%
20 a 2417,9%82,1%100%
25 a 2926,7%73,3%100%
TOTAL19,5%80,5%100,0%

Em São Gonçalo, onde há um contingente maior de jovens negros, a proporção total de respondentes que experimentou o racismo no ambiente de trabalho é cerca de cinco pontos percentuais maior do que em Niterói. Um dado interessante em relação à São Gonçalo é o de que a percepção do racismo entre os jovens parece se ampliar à medida que estes amadurecem (e também à medida que vivenciam mais situações de racismo). Na faixa etária de 15 a 19 anos 12,2% dos respondentes afirma ter vivenciado situações de preconceito ou discriminação racial no ambiente laboral.  Já no grupo entre 20 e 24 anos a proporção sobe para 18%, chegando a 26,7% no segmento entre 25 e 29 anos.

Em Niterói verificamos outro cenário. Os que menos declaram ter experimentado situações de racismo no trabalho são igualmente os jovens entre 15 e 19 anos (10,4%). Entretanto, na faixa etária mais alta essa proporção não se altera significativamente: 13,5% dos informantes entre 25 e 29 anos declara ter vivenciado o racismo no trabalho. Entre os que responderam afirmativamente ao item C25, a maior parcela – em Niterói – está na faixa etária entre 20 e 24 anos. Esse é o grupo etário correspondente ao ensino superior. Sendo Niterói sede de uma universidade pública federal (a Universidade Federal Fluminense) que atrai jovens de várias cidades e estados, podemos supor que essa percepção mais aguçada do racismo, nesse segmento específico se relacione a um grande número de universitários respondentes da pesquisa nesse município, pois é coerente imaginar que a vivência acadêmica proporcione espaços de reflexão sobre a discriminação e o preconceito racial.

Vejamos agora a associação entre raça e a percepção de que a cor da pele prejudica ou já prejudicou o jovem em contratação para empregos (tabelas 46 e 47). Essa associação incorpora exclusivamente os jovens que já trabalharam e os jovens que, embora nunca tenham trabalhado, já estão em busca de uma colocação.

 

Raça x A cor da pele prejudica ou já prejudicou a contratação em empregos
Tabela 46 – Niterói
QuiQuadrado169,0386279p-valor1,97E-37

 

 SimNãoTOTAL
Branco11468479
Preto343165
Pardo57179236
TOTAL102678780
 SimNãoTOTAL
Branco2,3%97,7%100%
Preto52,3%47,7%100%
Pardo24,1%75,9%100%
TOTAL13%87%100%
Tabela 47 – São Gonçalo
Qui Quadrado114,3642p-valor1,47E-25
 SimNãoTOTAL
 Branco5358363
Preto3969108
Pardo51340391
TOTAL95767862
 SimNãoTOTAL
Branco1,4%98,6%100%
Preto36,1%63,9%100%
Pardo13%87%100%
TOTAL11%89%100%

Em Niterói, entre os jovens que já participavam do mercado de trabalho, mais da metade dos pretos declara que a cor da sua pele já os prejudicou em processos de contratação. Enquanto isso, 24,1% dos pardos, e apenas 2,3% dos brancos informam a mesma percepção. Em São Gonçalo a tendência na distribuição das respostas se repete: também os pretos são os que mais sentem o racismo no momento da contratação, seguidos dos pardos e finalmente dos brancos. Entretanto observamos que a incidência do racismo sobre processos de contratação é menor em comparação com Niterói. No total 36% dos pretos declara já ter sido prejudicado em processos de contratação por conta da cor de sua pele. A mesma percepção é observada por 13% dos pardos e por apenas 1,4% dos brancos.

Ao que parece a cor da pele é uma questão menos importante para garantir a inserção no mercado de trabalho em São Gonçalo do que em Niterói. Isso pode ser atribuído ao fato da juventude de São Gonçalo ser predominantemente negra; o que tenderia a tornar mais uniforme as condições de acesso às oportunidades de emprego. Por outro lado, o cenário observado nesse município pode também ser o resultado de uma economia mais fraca, onde predomina a oferta de vagas que exigem menor qualificação, pagam menos e que, portanto, são mais facilmente acessadas pela população negra, que não perceberá, nesse contexto, a incidência do racismo com a mesma intensidade que se observa em Niterói.

Mais uma vez verificamos a questão do colorismo. Tanto em São Gonçalo, quanto em Niterói, há diferença na percepção do racismo no momento da contratação por pretos e pardos. Em Niterói, mais da metade dos pretos vivenciou dificuldades em processos de contratação em função da cor da pele, e menos de um quarto dos pardos teve a mesma experiência. Em São Gonçalo, cerca de 30% dos pretos se sentiu prejudicado no acesso a empregos em função da cor da pele e apenas pouco mais de 10% dos pardos tem a mesma percepção.

Exclusivamente em Niterói identificamos também que o racismo no momento da contratação não incide de maneira equânime sobre todos os segmentos do mercado, incidindo mais fortemente sobre o setor doméstico (tabela 48). Como essa associação incorpora o ítem “segmento de mercado em que trabalha”, aglutina apenas os jovens de Niterói que se encontravam empregados no momento do levantamento de dados.

 

Segmento do mercado em que trabalha x A cor da pele prejudica ou já prejudicou a contratação em empregos
Tabela 48 – Niterói
QuiQuadrado14,51938p-valor0,000703

 

 SimNãoTOTAL
Setor Doméstico142236
Iniciativa Privada61335396
Serviço Público107282
TOTAL85429514
 SimNãoTOTAL
Setor Doméstico39%61%100%
Iniciativa Privada15%85%100%
Serviço Público12%88%100%
TOTAL17%83%100%

Lembramos que, em Niterói, a maior parte dos jovens empregados no setor doméstico é negra (preta ou parda). Isso pode explicar porque nesse segmento os jovens vivenciam mais o racismo no momento da contratação.

Passamos agora a analisar a associação entre “raça” e a pergunta C21 (“a cor da sua pele influencia o tipo de emprego que você procura?”). Ela se mostrou significativa utilizando dados dos dois municípios.

Em Niterói mais da metade dos pretos (53%) considera a cor de sua pele ao definir o emprego ao qual irá se candidatar. A mesma percepção alcança 21,4% dos pardos e 13,6% dos brancos. Já em São Gonçalo, independente da raça, a maior parte dos jovens não leva em consideração a cor de sua pele ao buscar emprego. Esse comportamento é adotado por 29% dos pretos, por 15% dos pardos e por apenas 5,5% dos brancos.  Mais uma vez os dados nos permitem inferir que o mercado de trabalho em São Gonçalo é menos impactado pelas questões raciais. De toda forma, mesmo nesse município os pretos são os que mais observam tal aspecto ao buscar uma colocação no mercado de trabalho (tabelas 49 e 50).

 

Raça x A cor da pele influencia o tipo de emprego que procura

 

Tabela 49 – Niterói
QuiQuadrado63,68579p-valor1,48E-14
 SimNãoTOTAL
Branco65411476
Preto353166
Pardo51187238
TOTAL151629780
 SimNãoTOTAL
Branco13,6%86,4%100%
Preto53%47%100%
Pardo21,4%78,6%100%
TOTAL19,4%80,6%100%

 

Tabela 50 – São Gonçalo
Qui quadrado49,33787p-valor1,93E-11
 SimNãoTOTAL
Branco20345365
Preto3175106
Pardo59332391
TOTAL110752862
 SimNãoTOTAL
Branco5,5%94,5%100%
Preto29%71%100%
Pardo15%85%100%
TOTAL12,8%87,2%100%

 

É interessante contrapor essa análise à interpretação da associação entre as variáveis “raça” e a pergunta C20 (“acha que determinados trabalhos/profissões são definidos pela cor da pele?”). A maioria dos jovens entende que alguns trabalhos ou profissões são endereçados a segmentos raciais específicos. Nas duas cidades o contingente de brancos que manifesta esta percepção fica em torno de 60% do total. Pretos e pardos, como é de se esperar, percebem a situação de forma mais intensa: 86% dos jovens pretos entrevistados em Niterói e 87% desse grupo em São Gonçalo acredita que determinadas profissões e ou trabalhos são definidos pela cor da pele. Entre os pardos, 75,8% em Niterói e 68,3% em São Gonçalo manifestam a mesma opinião (tabelas 51 e 52).

 

Raça x Acha que determinados trabalhos/profissões são definidos pela cor da pele

 

Tabela 51 – Niterói
QuiQuadrado30,70831p-valor0,0000215
 SimNãoTOTAL
Branco367240607
Preto751287
Pardo23274306
TOTAL6743261000
 SimNãoTOTAL
Branco60,5%39,5%100%
Preto86,2%13,8%100%
Pardo75,8%24,2%100%
TOTAL67%33%100%

 

Tabela 52 – São Gonçalo
Qui quadrado30,64808p-valor0,0000221
 SimNãoTOTAL
Branco257165422
Preto10815123
Pardo310144454
TOTAL675324999
 SimNãoTOTAL
Branco61%39%100%
Preto87,8%12,2%100%
Pardo68,3%31,7%100%
TOTAL67,5%32,5%100%

Na associação anteriormente analisada (“raça” / “a cor da sua pele influencia o tipo de emprego que você procura?”) a maioria dos jovens afirma não considerar a cor da própria pele ao buscar emprego. Entretanto, como já havíamos identificado nas análises descritivas, a maioria reconhece a discriminação racial na estruturação do mercado de trabalho. O grupo que se autodeclara “preto” em Niterói é o único que tem mais da metade dos informantes declarando considerar a cor da própria pele ao identificar um emprego ao qual podem se candidatar. Mas mesmo em relação a esse grupo a contradição está colocada: enquanto 53% afirma considerar a cor da própria pele ao escolher um possível emprego, mais de 86% desse mesmo grupo reconhece que as profissões estão divididas pela cor da pele no mercado.

Ao refletir sobre tal contradição podemos levantar a hipótese de que a escolha de um emprego não se dá pontualmente, no exato momento em que se busca uma colocação. Ao contrário, a escolha de um emprego/profissão está vinculada a um processo forjado a partir da realidade socioeconômica do indivíduo.  A depender das oportunidades que lhes são possíveis ao longo de sua trajetória, o jovem chega ao momento de trabalhar com condições para escolher este ou aquele emprego. Se aos 22 anos não terminou o ensino médio, não irá buscar uma vaga como estagiário de advocacia. A questão pode ser justamente a forma como as oportunidades são distribuídas socialmente e o viés de raça por trás disso.

Outra hipótese é a de que os jovens podem se sentir constrangidos de se assumirem vítimas do racismo. Assim, reconhecem o problema de modo geral, mas na especificidade buscam se colocar “de fora” da questão. Seja como for esta é uma discussão complexa, sobre a qual a etapa qualitativa da pesquisa deve se debruçar.

Em São Gonçalo aparece como significativa uma associação entre faixa etária e a pergunta C20 (“acha que determinados trabalhos/profissões são definidos pela cor da pele?”). Ela segue apresentada na tabela 53.

 

Faixa Etária x Acha que determinados trabalhos/profissões são definidos pela cor da pele

 

Tabela 53 – São Gonçalo
Qui quadrado8,921861p-valor0,00000778

 

 SimNãoTOTAL
15 a 19177115292
20 a 24240100340
25 a 29260107367
TOTAL677322999
 SimNãoTOTAL
15 a 1960,6%39,4%100%
20 a 2470,6%29,4%100%
25 a 2970,8%29,2%100%
TOTAL67,8%32,2%100%

Essa associação confirma a análise já apresentada da tabela 45, que relaciona faixa etária com a pergunta C25 (“já sofreu situações de preconceito, discriminação ou injúria racial no trabalho?”). Mais uma vez é possível inferir que os jovens de São Gonçalo, independente da raça, percebem mais as discriminações no mercado de trabalho, à medida que se tornam mais velhos. Assim, enquanto entre 15 e 19 anos, 60,6% dos entrevistados desse município dizem perceber que existem empregos/profissões determinados pela cor da pele, essa proporção chega a 70,8% do grupo na faixa etária entre 25 e 29 anos. De toda forma, em todas as idades a grande maioria dos jovens declara ter essa percepção.

 

Políticas Públicas de Juventude e Trabalho

O último bloco de interpretação das associações dedica-se a analisar, a partir dos dados da pesquisa, as formas como os jovens de Niterói e São Gonçalo estão acessando, ou não, as principais políticas públicas de fomento à empregabilidade. Começamos com o Sistema Nacional de Emprego (SINE), que foi criado em 1975, sob a égide da Convenção nº 88 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). De acordo com essa convenção, todos os países-membro (incluindo o Brasil) devem manter um serviço público e gratuito de emprego, para a melhor organização do mercado de trabalho[16].

Como já observado durante as análises descritivas, nos dois municípios menos da metade dos jovens conhece o sistema (45,9% dos entrevistados em São Gonçalo e 36,1% em Niterói). Indagados se já haviam utilizado o SINE ou outra política pública de encaminhamento ao mercado de trabalho (ítem B18), 71,5% dos jovens de São Gonçalo e 62,1% dos jovens de Niterói disseram “não”. Podemos inferir, portanto, que o SINE é uma política pouco conhecida e menos ainda acessada pelos jovens.

Foi observada uma associação significativa entre a ítem B19 (Conhece o Sine?) e a renda familiar dos jovens, nos dois municípios (tabelas 54 e 55). Nota-se que há um missing equivalente ao número de jovens em cada município que não sabia declarar sua renda familiar.

 

Faixa de Renda Familiar x Conhece o SINE
Tabela 54 – Niterói
QuiQuadrado16,47470684p-valor0,000906167

 

 SimNãoTOTAL
0 a 13983122
1 a 3197233430
3 a 5145128273
>559103162
TOTAL440547987
 SimNãoTOTAL
0 a 132%68%100%
1 a 345,8%54,2%100%
3 a 553,1%46,9%100%
>536,4%63,6%100%
TOTAL44,6%55,4%100,0%

 

Tabela 55 – São Gonçalo
Qui quadrado15,8432665850148p-valor0,001221045
 SimNãoTOTAL
0 a 169125194
1 a 3277267544
3 a 5122108230
>59918
TOTAL477509986
 SimNãoTOTAL
0 a 135,6%64,4%100%
1 a 351%49%100%
3 a 553%47%100%
>550%50%100%
TOTAL48,4%51,6%100,0%

Em Niterói, somente na faixa de renda familiar entre 3 e 5 salários mínimos veremos mais da metade dos respondentes afirmando conhecer o Sistema Nacional de Emprego. No grupo de renda familiar entre 1 e 3 salários mínimos a proporção daqueles que conhecem o Sine é de 45,8%. Entre os que declaram renda familiar entre 0 e 1 salários mínimos e acima de cinco salários mínimos, em torno de 30% dos informantes afirma conhecer o Sine. (Tabela 54).

No caso dos dois últimos grupos citados, a proporção de jovens que conhecem a política é semelhante, mas certamente por motivos diferentes. Inferimos que os mais pobres estão excluídos ou por não terem acesso à informação, ou por terem dificuldade de acessar o serviço (falta de dinheiro para se deslocar até um posto do Sine, por exemplo), ou por não terem condições de acessar as vagas ofertadas, que demandam alguma escolaridade e qualificação. (Sabemos que a tendência é que indivíduos com menor renda apresentem menor escolaridade). No caso dos mais ricos a hipótese é oposta: talvez o tipo de emprego mapeado e ofertado pelo Sine não interesse aos indivíduos de maior renda e ou escolaridade.

De acordo com notícia publicada no sítio eletrônico do Ministério do Trabalho, a vaga de emprego campeã ofertada pelo Sine em 2017 é de “alimentador de linha de produção”, tendo sido anunciadas 3.556 vagas para essa função no ano. Outra atividade com grande número de oportunidades é a de operador de telemarketing. Para esse trabalho foram anunciadas 1.248 vagas. Em terceiro lugar está o posto de vendedor de comércio varejista, com 973 postos disponibilizados[17]. De fato, trata-se de um Sistema que enfatiza oportunidades de nível médio, tanto em termos de qualificação quanto de salário, o que pode ser desinteressante para os que possuem curso superior ou alta renda familiar. Ao mesmo tempo, essas vagas são inacessíveis para os de escolaridade muito baixa, como os que ainda cursam o ensino fundamental ou o ensino médio. Para funcionar como uma política universal, o SINE teria de oferecer uma diversidade maior de oportunidades de trabalho e de geração de renda.

Em São Gonçalo, município menos desigual do ponto de vista socioeconômico, a distribuição das respostas é mais equilibrada, com metade dos jovens em praticamente em todas as faixas de renda familiar declarando conhecer o Sine (tabela 55). O único estrato em que isso não acontece é naquele referente a jovens com renda familiar entre 0 e 1 salário mínimo. Nesse caso, como em Niterói, a proporção dos que conhecem o sistema fica em torno de 30% e podemos supor a mesma hipótese: os jovens mais pobres possuem menor acesso à informação e mais dificuldade em acessar o serviços.

A situação socioeconômica do jovem também incide sobre seu acesso a políticas voltadas à capacitação professional. Foram identificadas associações significativas em Niterói e São Gonçalo entre as variáveis renda familiar (A4) e a pergunta “Já acionou algum programa público de formação profissional? (B9).

 

Faixa de Renda Familiar x Já acionou algum programa público de formação profissional
Tabela 56 – Niterói
QuiQuadrado53,18417971p-valor1,67E-11

 

 SimNãoTOTAL
0 a 117114131
1 a 3135277412
3 a 570200270
5 a 1510146156
TOTAL232737969
 SimNãoTOTAL
0 a 17,4%15,5%13,5%
1 a 358%37,6%42,5%
3 a 530,3%27,1%28%
5 a 154,3%19,8%16%
TOTAL100%100%100%

 

Tabela 57 – São Gonçalo
Qui quadrado47,61546p-valor2,57E-10
  SimNãoTOTAL
 0 a 120159179
 1 a 367461528
 3 a 572164236
 5 a 1581321
TOTAL167797964
     
 1NãoTOTAL
0 a 112%20%18,5%
1 a 340,1%57,8%54,8%
3 a 543,1%20,6%24,5%
5 a 154,8%1,6%2,2%
TOTAL100%100%100%

 

Na coleta de dados foram exemplificadas como políticas de formação profissional, ações como Pronatec, Prouni, FIES e Projovem. Todas seguem em curso no país, embora o Pronatec e o Projovem tenham sido descontinuados em Niterói. De antemão também é necessário sinalizar que o missing observado (31 informantes em Niterói e 36 em São Gonçalo) corresponde à soma do missig verificado na variável “renda familiar” (13 para Niterói e 14 para São Gonçalo), com o missing verificado na variável B9 – “Já acionou algum programa público de formação profissional”? – equivalente à perda de 22 informantes em São Gonçalo e 18 em Niterói.

Nos dois municípios, os dados apontam que a grande maioria dos jovens não acessa tais programas. Em Niterói o grupo mais beneficiado é aquele cujas famílias apresentam renda familiar entre 1 e 3 salários mínimos. Na sequência está o grupo com renda familiar entre 3 e 5 salários mínimos. O grupo mais pobre (elegível para o Pronatec, por exemplo) tem apenas 7,4% dos informantes acessando tais programas. Entre os mais ricos (renda familiar entre 5 e 15 salários mínimos) apenas 4,3% dos jovens acessam essas políticas, proporção que, considerando a natureza das políticas em questão ainda parece alto para este segmento (tabela 56).

Em São Gonçalo a maior concentração entre os jovens que acessam tais programas está no segmento com renda familiar entre 3 e 5 salários mínimos, seguido pelo grupo com renda familiar entre 1 e 3 salários mínimos. Juntos os dois estratos correspondem a 83,2% dos jovens que acessam as políticas públicas de formação profissional. Os mais pobres (renda entre 0 e 1 salários mínimos) continuam excluídos, com apenas 12% de beneficiados por tais programas. Os mais ricos (renda entre 5 e 15 salários mínimos), respondem por quase 5% dos jovens beneficiados, em proporção semelhante à observada em Niterói (tabela 57).

Em relação às políticas públicas de formação profissional, portanto, podemos concluir que, no território abordado pela pesquisa, elas são de modo geral pouco acessadas pela juventude e particularmente pouco acessadas pelos jovens mais pobres, que seriam os principais destinatários de tais programas. A pesquisa identifica, por outro lado, um contingente significativo e jovens mais ricos que usufruem de tais ofertas.

 

Já acionou algum programa público de formação profissional x Faixa Etária

 

Tabela 58 – São Gonçalo
Qui quadrado15,83508p-valor 
 15 a 2920 a 2425 a 29TOTAL
Sim316474169
Não273256277806
TOTAL304320351975
 15 a 2920 a 2425 a 29TOTAL
Sim18,3%37,9%43,8%100%
Não33,9%31,8%34,3%100%
TOTAL31,2%32,8%36%100%

 

Em São Gonçalo, especificamente, o acesso às políticas de formação profissional encontra-se igualmente associado à faixa etária dos jovens. Observamos que os beneficiários das políticas públicas de formação profissional são principalmente os jovens a partir dos 20 anos, com destaque para o segmento mais “velho” (25 a 29 anos) que responde por 43,8% do total dos que acessam tais políticas (tabela 58).

Uma possível explicação para essa tendência, é o fato de que tais programas vem perdendo orçamento – e consequentemente a capacidade de atendimento da população jovem – nos últimos anos. O Projovem, foi criado em 2005, e se efetivava a partir de convênios entre governos municipais ou estaduais e a União, que viabilizava a maior parte das verbas do programa. A partir de 2014 sofreu cortes significativos. Em 2018, só estava disponível em 17 estados e 70 municípios, incluindo, no  estado do Rio de Janeiro, o município de São Gonçalo. O Prouni reduziu drasticamente o número de bolsas ofertadas a partir de 2016[18]. O FIES vem sofrendo perdas orçamentárias desde 2016[19], enquanto o Pronatec perdeu 60% do seu orçamento em 2015[20].

Os jovens mais velhos tiveram a oportunidade de serem atendidos por essas políticas há alguns anos, quando estas apresentavam maior capacidade de atendimento. Os mais jovens alcançam a idade que os torna elegíveis a tais benefícios num momento em que o acesso a eles está mais difícil.

       

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[1] A tribo dos Temininós do cacique Araribóia.
[2] Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, disponível em http://atlasbrasil.org.br/2013/pt/perfil_m/sao-goncalo_rj, acessado em 07 de março de 2018. 
[3] O Índice de Gini, criado pelo matemático italiano Conrado Gini, mede a concentração de renda em um grupo social. Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos. Numericamente, varia de zero a um. O valor zero representa a situação de igualdade. O valor um está no extremo oposto. in www.ipea.gov.br, acessado em 11 de fevereiro de 2018.
[4] O índice de Gini chegou a 0,515 em 2014, mas voltou a subir em 2015 chegando a 0,523.
[5] http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/ibge/censo/cnv/ginirj.def, acessado em 11 de fevereiro de 2018.
[6] http://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2017-09/taxa-de-desemprego-fica-em-126-em-agosto [7] in portal.mec.gov.br/pronatec acessado em 7 de maio de 2018
[8]  In fiesselecao.mec.gov.br/ acessado em 7 de maio de 2018
[9] In prouniportal.mec.gov.br/ acessado em 7 de maio de 2018
[10] In juventude.gov.br/juventude/noticias/projovem-2018-atuara-em-17-estados-e-70-municipios
[11] O valor de p é calculado em função da distribuição das respostas. Um grande número de respostas pode gerar um p-valor menor, enquanto um número menor de respostas tende a gerar valores de p mais altos. Como nem todas as perguntas foram aplicadas a todos os entrevistados, o número de respostas por ítem varia, tornando impossível comparar a significância entre determinadas associações.
[12] In https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/20117-pnad-continua-tri-subutilizacao-da-forca-de-trabalho-e-de-23-6-no-4-tri-e-fecha-2017-em-23-8.html
[13] O PIB per capita de Niterói é de R$51.779,62 (cinquenta e um mil, setecentos e setenta e nove reais e sessenta e dois centavos) enquanto o de São Gonçalo é de R$ 15.963,41 (quinze mil, novecentos e sessenta e três reais e quarenta e um centavos). In https://cidades.ibge.gov.br/, acessado em 18 de março de 2018.
[14] A proposta de emenda constitucional que equiparou o direitos das domésticas aos de outros tralhadores foi aprovada em abril de 2013, mas regulamentada apenas em junho de 2015, passando a vigorar desde então.
[15] http://portal.inep.gov.br/artigo/-/asset_publisher/B4AQV9zFY7Bv/content/mulheres-sao-maioria-na-educacao-superior-brasileira/21206 acessado em 22 de junho de 2018.
[16] Ministério do Trabalho. In portalfat.mte.gov.br/programas-e-acoes-2/sistema-nacional-de-emprego-sine/ acessado em 28 de março de 2018.
[17] In www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2017/06/sine-oferece-mais-de-26-mil-vagas-de-emprego, acessado em 28/03/2018
[18] https://www.prouni.net/prouni-vai-acabar.html
[19] www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2017/07/30/internas_economia,613574/por-que-mensalidades-ficarao-mais-caras-com-as-mudancas-no-fies.shtml
[20] https://br.reuters.com/article/domesticNews/idBRKBN0OR00R20150611
Conclusões da pesquisa | fase quantitativa
Niterói e São Gonçalo

 

Verificamos a partir das estatísticas, tanto as descritivas, quanto as de associação que, no que diz respeito à empregabilidade da juventude, Niterói e São Gonçalo possuem muitos pontos em comum: o índice de desemprego entre jovens em torno de 30%, a faixa salarial e o tempo de vida laboral predominante para a juventude, o segmento do mercado e o tipo de vínculo empregatício acessado por esse grupo social, entre outras questões. Ao que parece, os dois municípios configuram um território onde se observa uma mesma tendência orientadora no que se refere à participação dos jovens no mercado de trabalho.

Apesar das características em comum, no entanto, a pesquisa também revela particularidades dos dois municípios que podem e devem ser consideradas em ações de incidência política voltadas especificamente para cada uma das duas municipalidades.

Niterói – que foi capital do estado do Rio de Janeiro por mais de 100 anos, da segunda metade do século XIX até 1975 – apresenta-se como uma cidade mais próspera do ponto de vista econômico. Seu PIB per capta em 2015 era de R$51.779,62 (cinquenta e um mil, setecentos e setenta e nove reais e sessenta e dois centavos), bem maior do que o PIB per capta nacional no mesmo período: R$29.231,71 (vinte e nove mil, duzentos e trinta e um reais e setenta e um centavos). Já o PIB per capta de São Gonçalo em 2015 ficou em R$15.963,41 (quinze mil, novecentos e sessenta e três reais e quarenta e um centavos)[1]. Não é apenas muito menor do que o observado em Niterói, como também bem abaixo da média nacional.

Simultaneamente Niterói é um município majoritariamente branco. De acordo com pesquisa do Laboratório de Análises Econômicas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais (Laeser), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Niterói é um dos municípios do estado do Rio de Janeiro com o menor número de negros. A cidade ficou em 84ª posição, entre os 92 municípios do estado e, em nível nacional, ocupa o 3.921º lugar, no que se refere ao número de habitantes negros. Ou seja, em todo o Brasil apenas 1.643 cidades possuem menos negros que Niterói (PAIXÃO et al, 2015). Essa tendência se espelha na sua população jovem, constituída por 60,35% de brancos. Em direção oposta, São Gonçalo, de acordo com a mesma pesquisa, é uma das cidades com maior número de negros no Rio de Janeiro, ocupando 29ª posição em comparação com outros municípios do estado. No ranking nacional sua posição é a de número 2.779 (ibidem). A população jovem de  São Gonçalo é constituída por 45% de pardos e 12% de pretos. Logo, mais da metade dos jovens de São Gonçalo são negros.

Trata-se de uma coincidência? Podemos supor que não. A cidade de Niterói, a partir do final dos anos 1980 vivenciou um processo que buscava retomar a importância perdida desde que deixara de ser capital do estado. Apostando na estratégia de estabelecer uma cidade voltada à serviços e moradia, a administração pública local da época lançou vários projetos, realizou melhorias viárias e deu apoio a empreendimentos imobiliários, a projetos de serviços privados e de comércio alto padrão. As décadas de 1990 e 2000 assistiram ao lançamento de inúmeros estabelecimentos como shopping centers, hospitais e clínicas particulares, colégios e universidades privadas[2]. Divulgada como a “quarta cidade em qualidade de vida do país” Niterói teve seu metro quadrado valorizado. Devido à elevação dos preços dos imóveis e do custo de vida em geral, moradores nativos mais pobres (na maioria das vezes negros) são “empurrados” para as cidades do entorno, no fenômemo conhecido como “gentrificação”[3]. São Gonçalo é uma dessas “cidades do entorno”, que irá receber essa população negra e pobre.

Cabe salientar que apesar do alto PIB per capta, mais da metade dos jovens de Niterói (55%) vivem em famílias com renda mensal de até 3 salários mínimos. (Em São Gonçalo essa faixa de renda familiar alcança 73% dos jovens). Ou seja, há ainda um contingente significativo de pobres em Niterói, embora não represente um grupo tão grande quanto em São Gonçalo. Essa espessa camada de pobres aponta que, além de mais “rica”, Niterói é também uma cidade mais desigual, o que explica que os indicadores de renda per capta se mantenham altos. Na contramão do que ocorreu no país, a cidade ampliou seu índice de Gini5 a partir de 1990, chegando a 0,598 em 2010, bem acima do índice nacional que na mesma época era de 0,530.

São Gonçalo, por outro lado, é uma cidade mais igualitária, com índice de Gini de 0,430, em 2010, tendo sido observada sua redução ao longo das duas décadas anteriores. Trata-se, no entanto, de um nivelamento econômico “por baixo”. Como já dito, 73% dos jovens vive em famílias com renda de até 3 salários mínimos. As famílias com renda entre 3 e 5 salários mínimos acolhem 24% da juventude (em Niterói 28% dos jovens estão nessas famílias) e apenas 2% declara renda familiar entre 5 e 15 salários mínimos. Ao contrário de Niterói, não há jovens em famílias com renda de mais de 15 salários mínimos.

Nesse contexto de maior pobreza, e de uma pobreza mais “igualitariamente distribuída”, as diferenças raciais se mostram mais “diluídas”, embora em alguns casos ainda evidente. Foram testadas para São Gonçalo as mesmas 74 associações idealizadas para Niterói e apenas duas envolvendo a variável “raça” se mostraram significativas. (Para Niterói foram validadas 10 associações envolvendo a variável “raça”). Um exemplo é a associação entre “raça” e “renda familiar”, que se mostrou significativa para Niterói e não para São Gonçalo. Ou seja, enquanto em Niterói a cor da pele está associada ao nível socioeconômico do indivíduo, em São Gonçalo a tendência é a de que não faça diferença ser branco ou negro para ter renda familiar maior ou menor (lembrando sempre que a renda familiar, em São Gonçalo, poucas vezes passará de 5 salários mínimos).

A partir das conclusões dessa etapa quantitativa da pesquisa, refletimos sobre a necessidade do movimento negro aprofundar o debate sobre as diferenças de classes sociais, na perspectiva da interseccionalidade. Ainda que em São Gonçalo haja uma maioria de jovens negros (57%), o contingente de brancos ainda seria suficientemente significativo para que as questões raciais aflorassem. Entretanto, nesse município, muitos brancos são tão pobres quanto os negros. E isso parece fazer alguma diferença.

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Desemprego

Quando calculamos os índices de desemprego para as duas cidades, consideramos apenas o contingente de jovens que já se econtram inseridos no mercado de trabalho. Esse grupo equivale a 86% dos jovens de São Gonçalo e a 78% dos jovens de Niterói. São jovens que estão trabalhando ou procurando emprego. Entre os que procuram emprego há os que já trabalharam antes e aqueles que estão em busca de sua primeira colocação.

O índice de desemprego entre jovens no Brasil era de 29% em 2017, já sendo considerado um índice alto pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). Em Niterói, o desemprego entre jovens é de 32,7%, e em São Gonçalo é de 34,7%. A situação é ainda mais crítica para os jovens entre 15 e 19 anos: 51% em Niterói e 52% em São Gonçalo vive o desemprego. Possivelmente isso se deva à menor experiência e escolaridade acumulada pelos indivíduos nessa faixa etária. (Entre 20 e 24 anos 31% dos jovens das duas cidades estão sem trabalho, entre 25 e 29 anos a taxa cai para 27% em Niterói e 29% em São Gonçalo).

Em Niterói há, em acréscimo, um viés racial no desemprego. Enquanto a taxa de desocupação é de 32% para brancos e pardos, para os jovens que se autodeclaram pretos o desemprego é 14 pontos percentuais maior (46%). Nos dois municípios o desemprego também é maior entre as mulheres. Em Niterói 37% das mulheres está desempregada, contra 29% dos homens. Em São Gonçalo 40% das mulheres está desempregada, contra 29% dos homens.

Percebemos que, no que diz respeito à desemprego, a faixa etária é o elemento que incide com maior potência sobre as juventudes. Em Niterói esse o segundo aspecto em influência é a raça, enquanto em São Gonçalo, depois da faixa etária é o sexo que determina maior ou menor nível de ocupação dos jovens.

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No Mercado de Trabalho

O vínculo empregatício predominante varia conforme a faixa etária e também entre os municípios. Na faixa etária entre 15 e 19 anos, nos dois municípios, além do desemprego ser maior, quando o jovem trabalha observa em grande parte dos casos um vínculo precário: a maioria atua como “autônomo informal”, categoria que implica em atividades laborais sem nenhum tipo de vínculo ou formalidade. O dado nos permite inferir que a pouca experiência e escolaridade desse grupo o torna mais vulnerável em suas relações com contratantes.

Nas demais faixas etárias predominam os vínculos com carteira assinada, o que é um dado positivo. Ainda assim a informalidade tem um papel importante: 25% dos jovens trabalhadores de Niterói e 32% dos jovens trabalhadores de São Gonçalo atuam como “autônomos informais”. Os homens são maioria nesse segmento. Esse é um dado importante do ponto de vista das relações de gênero, pois leva a crer que ainda recai sobre o sexo masculino a obrigação de produzir renda, o que os torna vulneráveis no momento de se submeter a vínculos precários e baixos salários.

De modo geral a maioria dos jovens está no setor privado. Em Niterói, a maior parte dos trabalhadores desse segmento são homens e mulheres brancos. Já em São Gonçalo predominam na iniciativa privada homens brancos e pardos (nessa ordem). No setor público em Niterói novamente predominam homens e mulheres brancos, enquanto em São Gonçalo os funcionários públicos são majoritariamente homens pardos, e, em segundo lugar homens brancos. Essa distribuição demonstra a maior incidência das questões raciais no mercado de trabalho em Niterói, e a prevalência das questões de gênero em São Gonçalo.

O setor doméstico é o que menos emprega, indicando que, talvez, os jovens não estejam interessados nesse segmento, efetivamente o mais desvalorizado do ponto de vista simbólico. Entre os que atuam como trabalhadores domésticos em Niterói a maioria são negros (75% dos trabalhadores do setor) e mulheres (78% dos trabalhadores do setor). Em São Gonçalo a associação entre raça e segmento de mercado não se mostrou significativa, mas, a questão de gênero prevalece com as mulheres representando 87% dos trabalhadores domésticos. Ou seja, o cuidado com a casa permanece compreendido como uma atividade feminina.

Proporcionalmente os negros são os que ingressam mais cedo no mercado de trabalho, tanto em Niterói quanto em São Gonçalo. Os salários pagos aos jovens se equivalem nos dois municípios variando, na maior parte dos casos, entre 0 e 3 salários mínimos. Ao contrário do que se poderia imaginar, Niterói não paga salários maiores em relação à São Gonçalo. O que se percebe, em termos de vantagem para a juventude niteroiense é a tendência do jovem nessa cidade ingressar mais tarde no mercado de trabalho, acumulando mais anos de estudo e maior escolaridade.

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Colorismo

O colorismo se revela bastante forte no território abordado pela pesquisa, com diferenças singnificativas na forma como pretos e pardos vivenciam o mundo do trabalho.

Em Niterói o índice de desemprego entre pardos é idêntico ao dos brancos (32%), enquanto entre pretos é 14 pontos percentuais maior. Enquanto 72% dos pardos vem de famílias que vivem com renda entre 0 e 3 salários mínimos, entre os pretos essa proporção é 11 pontos percentuais maior. Em relação aos pardos, os pretos estão mais presentes no setor doméstico – o menos valorizado em termos sociais.

Nos dois municípios os pretos em maior número declaram terem sido vítimas de situações de racismo no trabalho, e também se sentem mais prejudicados pela cor da pele nos processos de contratação para empregos. Os pretos também tendem a ingressar antes dos pardos no mercado de trabalho, acumulando menos anos de estudo.

É importante frisar que se de um lado os pardos são menos excluídos do que os pretos, isso não quer dizer que estejam “a salvo” da exclusão. Em Niterói, enquanto 72% dos pardos vive com até 3 salários mínimos, entre os brancos essa proporção é de 44%. Na direção contrária, enquanto 22% dos brancos tem renda entre 5 e 15 salários mínimos, apenas  7% dos pardos vivem a mesma realidade. Proporcionalmente, os pardos estão em menor número no setor doméstico em comparação com os pretos, mas são muito mais presentes do que os brancos. Os pardos também declaram menos a vivência de situações de racismo no trabalho, se comparados aos pretos, mas declaram essa experiência em número muito maior do que os brancos, bem como percebem em maior proporção dificuldades nos processos de contratação de empregos.

A questão do colorismo deve ser especificamente considerada. De um lado para reforçar a afirmação identitária dos pardos enquanto protagonistas das lutas pela igualdade racial, do mesmo modo que pretos. De outro lado é preciso, ao mesmo tempo, sublinhar efetivamente o preconceito maior sofrido por pretos, no sentido de qualificar as estratégias de luta em favor desse segmento: tratar diferentemente os diferentes, para que todos tenham igualdade de oportunidades.

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Contradições

Os jovens das duas cidades pesquisadas percebem que o mercado de trabalho é discriminatório. Em torno de 70% dos entrevistados, tanto em Niterói quanto em São Gonçalo, identificam que há trababalhos e profissões vinculados à cor da pele. Entretanto, quando se indaga aos jovens se eles consideram a cor de sua pele na hora de eleger a vaga de emprego à qual irão se candidatar, só 19% dos informantes em Niterói, e apenas 12% dos informantes em São Gonçalo respondem que “sim”. Ou seja, embora percebam o racismo no mundo do trabalho, não se identificam particularmente como vítimas de racismo em suas vidas profissionais.

Essa contradição pode ter várias origens. A escolha por candidatar-se a uma determinada vaga de emprego é uma construção pessoal, mas também social. O contexto de vida em que se encontra o indivíduo tende a pré-determinar seu leque de opções. Assim, se ele ainda não terminou o ensino médio aos 22 anos, não passará por sua cabeça buscar uma vaga como estagiário de um escritório de advocacia simplesmente porque essa opção não está colocada sob qualquer hipótese. O jovem, então, tende a fazer sua escolha dentro de um universo de possibilidades que considera ao seu alcance e, nessa situação, não será de fato vítima de discriminação. O racismo se impõe, portanto, previamente, de forma estrutural, através de mecanismos sociais que limitam as perspectivas de quem é negro, de quem é pobre, e duplamente de quem é negro e pobre.

De outro lado é preciso também supor que essa contradição pode ter origem na dificuldade do jovem – no momento da entrevista – de se reconhecer e se autodeclarar vítima do racismo. Esse fator pode ter contribuído para um grande número de respostas negativas ao item em questão.

Outra contradição observada pela pesquisa no âmbito da percepção do racismo pelos jovens diz respeito à identificação de situações de discriminação, preconceito ou injúria racial no ambiente de trabalho. Mais da metade dos pretos (57%) e 30% dos pardos de Niterói afirmam já ter vivenciado tal experiência. Em São Gonçalo também mais da metade dos pretos (53%) e um quarto dos pardos dão a mesma resposta. Entretanto, esses números não aparecem espelhados quando a pergunta se volta para a especificidade do caso na vida de cada jovem.

Quando perguntamos se a cor pela interfere ou já interferiu na relação dos jovens com seus colegas de trabalho, apenas 9% dos informantes em São Gonçalo e 6,5% em Niterói respondem afirmativamente. Quando a pergunta é se a cor da sua pele interfere ou já interferiu na relação com superiores ou contratantes, o número cresce um pouco: 14% em São Gonçalo e 9% em Niterói. Mesmo segmentando as respostas por raça, análise que foi possível em Niterói, continuaremos vendo que as proporções não se equivalem. Gira em torno de 30% o contigente dos jovens desse município que declara ter vivenciado problemas com colegas ou com superiores/contratantes por causa da cor da sua pele. Mesmo que ninguém tenha respondido afirmativamente às duas perguntas, o somatório (pouco mais de 60%) seria inferior ao 77% de jovens negros que afirmou ter sido vítima de racismo no trabalho.

Mais uma vez nos vemos diante da hipótese de que é mais fácil para os jovens descrever o racismo no geral do que reconhecê-lo em situações específicas do seu cotidiano. Se esta ideia se confirma, pode representar uma dificuldade para a mobilização da juventude em torno da luta de enfrentamento ao racismo no mundo do trabalho.

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Políticas Públicas de Juventude e Trabalho

As políticas públicas que incidem sobre a interface juventude e empregabilidade são pouco conhecidas e menos ainda acionadas pelos jovens de Niterói e São Gonçalo. Quando mencionamos os programas de formação profissional, tais como Pronatec, Projovem, Prouni ou FIES, 80% dos jovens de São Gonçalo e 74% dos jovens de Niterói dizem jamais terem acionado quaisquer um desses programas. No que se refere ao Sistema Nacional de Emprego (SINE), menos da metade dos jovens o conhecem, e apenas 23% dos jovens de São Gonçalo e 18,6% dos jovens de Niterói já fizeram uso dele ou de outra ação pública para buscar emprego.

Em outras palavras as políticas públicas ofertadas não são divulgadas entre os jovens, ou não os atraem. Em acréscimo, e especificamente no caso do SINE, esta política termina não se mostrando atraente para jovens de camadas mais ricas, nem beneficiando os jovens de camadas mais pobres. Inferimos que isso se deva ao fato do SINE limitar sua oferta de oportunidades a empregos a um segmento médio do mercado, que que exige escolaridade intermediária (ensino médio completo em sua maioria), oferecendo baixos salários e pouca perspectiva de avanço. Tais vagas não interessam aos jovens de classes econômica mais alta, e muitas vezes não são acessíveis para os jovens mais pobres, com baixa escolaridade.

Além disso, o SINE mantém poucos postos de atendimento (em Niterói há um posto e em São Gonçalo há dois). Jovens de baixa renda deverão se deslocar até esses postos para acessar o serviço. Aqueles jovens mais pobres que não possuírem conhecimento do endereço do posto de atendimento ou – mais comum –  que não tenham recursos para o deslocamento, tendem a serem excluídos do serviço, antes mesmo de serem excluídos da oportunidade de emprego por qualquer limitação de escolaridade ou experiência.

Para afirmar-se como política universal, como se apresenta, o SINE  precisaria diversificar o perfil das oportunidades que disponibiliza e  deveria capilarizar o acesso ao serviço. Uma  articulação entre o SINE e   as prefeituras  poderia viabilizar, por exemplo,  o  acesso ao cadastro do sistema a partir dos Centros de Referência em Assistência Social, que se encontram  em maior número tanto em Niterói  quanto em São Gonçalo.

 

[1] https://cidades.ibge.gov.br/painel/economia.php?codmun=330330, acessado em 30 de março de 2018.

[2][2] https://pt.wikipedia.org/wiki/Economia_de_Niter%C3%B3i acessado em 24 de junho de 2018.

[3] Gentrificação é um processo de transformação de centros urbanos que decorre de uma  série  de  melhorias  físicas  ou  materiais  e  mudanças  imateriais – econômicas, sociais  e  culturais –  os  quais experimentam uma apreciável elevação de seu status. Isto faz com que faz haja aumento do custo de vida no bairro, e por consequência, afaste seus moradores tradicionais, modificando os grupos sociais que habitam o espaço: sai a comunidade de baixa renda e entram moradores das camadas mais ricas. (BATALLER e BOTELHO, 2012)

Metodologia, plano amostral e precisão da amostra

 

PLANO AMOSTRAL

 

A população de interesse da pesquisa são jovens moradores de Niterói e São Gonçalo. Foram consideradas as duas populações em separado, quer seja pelas especificidades socioculturais, quer seja pela necessidade de produzir informação desagregada por município, uma vez que a pesquisa deve gerar subsídio para a atuação política de grupos/instituições que, em sua maioria, atuam politicamente em âmbito local.

Foram utilizados os dados de população apontados pelo Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (http://cidades.ibge.gov.br/). Também foi assumido como “jovem” o indivíduo entre 15 e 29 anos, acatando o que preconiza o Estatuto da Juventude no Brasil (BRASIL, lei 12.852 de 2013). De   acordo   com   dados   do Censo 2010, Niterói tem uma   população de 487.562 habitantes. Desse total 113.978 (23,37%) são jovens de 15 a 29 anos. Já São Gonçalo conta com uma população de 999.728 habitantes, sendo 244.626 jovens de 15 a 29 anos (24,47% do total).

Para construção da amostra, a técnica utilizada foi a amostragem aleatória estratificada proporcional.  Esta técnica é apropriada quando a população se divide em subpopulações (estratos) razoavelmente homogêneas, como é o caso. Sendo possível o uso da técnica, ela tende a gerar resultados mais precisos, na medida que garante uma representação proporcional de cada grupo constituinte da população na amostra selecionada. Dessa forma é possível obter menor erro amostral com o mesmo tamanho de amostra, em relação à amostra aleatória simples (BRITO, 2005).

A população jovem de cada município foi estratificada por faixa etária, acatando a divisão já observada pelo questionário do Censo 2010 do IBGE para o segmento juventude:  15 a 19 anos, 20 a 24 e 25 a 29 anos. O grupo também foi estratificado por sexo (feminino e masculino) e raça autodeclarada, conforme opções de resposta do questionário do Censo 2010: preto, branco, amarelo, indígena ou pardo. (Como faz o IBGE, a presente pesquisa reúne pretos e pardos na categoria “negros”[1]). Para a população de cada município foram obtidos 30 estratos.

Utilizando novamente dados do Censo 2010, a população jovem de cada município foi distribuída pelos estratos conforme ilustram as tabelas 1 (Niterói) e 8 (São Gonçalo).    Na sequência foi calculada a proporção correspondente a cada estrato com relação ao total da população jovem de cada município (Tabelas 2 e 9).

Objetivando o menor erro amostral possível para o quantitativo de recursos disponível para a pesquisa, foi definida uma amostra de 1.000 indivíduos para coleta de dados, tanto em Niterói como em São Gonçalo.  Embora a população de São Gonçalo seja praticamente o dobro da população de Niterói, o cálculo de erro amostral demonstrou que não havia ganho significativo com uma amostra maior, de modo que o número de 1000 informantes por amostra foi mantido para a investigação nos dois municípios.

Na composição da amostra, a proporção de indivíduos por faixa etária, sexo e raça   autodeclarada; identificada   no   conjunto   da   população, foi   respeitada conforme apontado nas tabelas 3 e 10.  Ao trabalhar essa correspondência, os estratos relativos à população indígena, nos dois sexos e nas três faixas etárias tornaram-se insignificantes, tendo sido descartada a necessidade de entrevistar indivíduos desse grupo. De outro lado, a população de raça amarela fica subrepresentada, gerando um erro amostral muito grande: cerca de 40 pontos percentuais para mais ou para menos (tabelas 6 e 13). Considerando que ambos os grupos (indígenas e amarelos) estariam submetidos a questões raciais muito específicas, que fogem ao escopo da presente investigação, optou-se por excluí-los do levantamento de dados. Essa exclusão – sete informantes na amostra de Niterói e seis informantes na amostra de São Gonçalo – foi compensada de modo a que se mantivesse a amostra total de 1.000 informantes por município, e os mesmos totais com relação aos estratos de sexo e faixa etária. A amostra final é representada pelas tabelas 7 e 14.

 

Precisão da Amostra

As medidas de erro amostral relativas à mensuração dos indicadores da pesquisa em questão foram calculadas utilizando-se um nível de confiança de 95% e supondo amostra aleatória simples em cenários de maior variabilidade possível para cada categoria de cruzamento (faixa etária, sexo e raça declarada) [2]. As medidas de erro amostral são apresentadas nas tabelas 4, 5 e 6, no caso de Niterói; e 11, 12 e 13 no caso de São Gonçalo. Ou seja, considerando um cenário de diversidade máxima das populações analisadas (em relação ao sexo,a  raça e faixa etária), temos 95% de probabilidade das amostras desenhadas serem representativas das populações de Niterói e de São Gonçalo.

No cálculo dos erros amostrais apresentados, utiliza-se um modelo mais simplificado, em que se supõe que as observações são variáveis aleatórias independentes com valor esperado igual à proporção populacional. O erro amostral aponta quantos pontos percentuais as respostas de determinado estrato da população irão variar em relação às respostas obtidas com a amostra. Veremos que a margem de erro varia conforme a categoria. O erro é maior quando consideramos isoladamente as respostas dos pretos em Niterói, por exemplo, porque essa população é menor nesse município. De modo geral, no entanto, considerando todos os estratos em conjunto, o erro amostral aferido é de 3,09; satisfazendo os parâmetros de confiabilidade.

 

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NITERÓI

População Total: 487.562

População jovem N (15 a 29 anos): 113.978 (23,37%)

Fonte: cidades.ibge.gov.br – censo demográfico 2010

 

Tabela 1 – População Jovem de Niterói por estratos.
 15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anos
 homensmulhereshomensmulhereshomensmulheres
 16.54516.42119.04819.68920.34721.928
TOTAL32.96638.73742.275
Pretos3.7063.7904.137
1.8601.8461.8571.9331.9902.147
Brancos18.76324.02026.578
9.4179.34611.77012.25012.78413.794
Indígena415162
212025263032
Amarelo211218289
106105107111139150
Pardo10.24510.65511.206
5.1425.1035.2215.4345.3905.816

 

Tabela 2 – Representatividade dos estratos em relação à população jovem de Niterói
 15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anos
 homensmulhereshomensmulhereshomensmulheres
 (14,51%)(14,40%)(16,71%)(17,27%)(17,85%)(19,24%)
TOTAL(29%)(34%)(37%)
Pretos(3,25%)(3,33%)(3,63%)
(1,63%)(1,62%)(1,63%)(1,7%)(1,75%)(1,88%)
Brancos(16,46%)(21,07%)(23,32%)
(8,26%)(8,2%)(10,33%)(10,74%)(11,22%)(21,1%)
Indígena(0,03%)(0,04%)(0,05%)
(0,02%)(0,01%)(0,02%)(0,02%)(0,025%)(0,025%)
Amarelo(0,19%)(0,2%)(0,25%)
(0,1%)(0,09%)(0,1%)(0,1%)(0,12%)(0,13%)
Pardo(8,99%)(9,34%)(9,83%)
(4,52%)(4,47%)(4,58%)(4,76%)(4,73%)(5,1%)
        
Tabela 3 – Amostra Estratificada Proporcional de 1.000 indivíduos. (NITERÓI)
 15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anos
 homensmulhereshomensmulhereshomensmulheres
 146144166172178193
TOTAL290339371
Pretos333337
171616171819
Brancos165211233
8382103108112121
Indígena
Amarelo223
111112
Pardo909398
454546474751

 

ERRO AMOSTRAL

Tabela 4 – Erro Amostral por faixas etárias (NITERÓI)
15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anosTOTAL
5,73 (%)5,31 (%)5,07 (%)3,09 (%)

 

Tabela 5 – Erro Amostral por sexo (NITERÓI)
femininoMasculinoTOTAL
4,32   (%)4,41  (%)3,09 (%)
Tabela 6 – Erro Amostral por raça autodeclarada (NITERÓI)
BrancoPretoPardoAmareloTOTAL
3,96  (%)9,61   (%)5,82  (%)36,89 (%)3,69 (%)
Tabela 7 – Amostra final (NITERÓI)
 15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anos
 homensmulhereshomensmulhereshomensMulheres
 146144166172178193
TOTAL290339371
Pretos333337
171616171819
Brancos167213236
8483104109113123
Pardo909398
454546474751

 

SÃO GONÇALO

População Total: 999.728

População jovem N (15 a 29 anos): 244.626

Fonte: cidades.ibge.gov.br – censo demográfico 2010

 

Tabela 8 – População Jovem de S. Gonçalo por estratos.
 15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anos
 homensmulhereshomensmulhereshomensmulheres
 38.60439.55538.85341.64041.22544.749
TOTAL78.15980.49385.974
Pretos9.3989.86210.708
4.6434.7554.7635.0995.1405.568
Brancos31.50334.07837.280
15.56215.94116.46017.61817.89419.386
Indígena665765
333328293134
Amarelo473466473
234239225241227246
Pardo36.72136.03037.448
18.14018.58117.40218.62817.97519.473
Tabela 9 – Representatividade dos estratos em relação à população jovem de S.Gonçalo:
 15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anos
 homensmulhereshomensmulhereshomensmulheres
 (15,78%)(16,17%)(15,88%)(17,02%)(16,85%)(18,29%)
TOTAL(31,95%)(32,9%)(35,14%)
Pretos(3,84%)(4%)(4,38%)
(1,9% )(1,94%)(1,95%)(2,08%)(2,1%)(2,28%)
Brancos(12,88%)(13,9%)(15,2%)
(6,36%)(6,52%)(6,72%)(7,2% )(7,31%)(7,92%)
Indígena(0,03%)(0,02% )(0,03%)
(0,01%)(0,02%)(0,01%)(0,01%)(0,01%)(0,02%)
Amarelo(0,19% )(0,19%)(0,19%)
(0,09%)(0,1% )(0,09%)(0,1%)(0,09%)(0,1%)
Pardo(15%)(14,72%)(15,3%)
(7,41%)(7,59%)(7,11%)(7,61%)(7,35%)(7,96%)
Tabela 10 – Amostra Estratificada Proporcional de 1.000 indivíduos. (SÃO GONÇALO)
 15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anos
 homensmulhereshomensMulhereshomensmulheres
 158161159170169183
TOTAL319329352
Pretos384144
191920212123
Brancos129139152
646567727379
Indígena
Amarelo222
111111
Pardo150147154
747671767480

ERRO AMOSTRAL

Tabela 11 – Erro Amostral por faixas etárias (SÃO GONÇALO)
15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anosTOTAL
5,48     (%)5,39   (%)5,21     (%)3,09 (%)

 

Tabela 12 – Erro Amostral por sexo (SÃO GONÇALO)
FemininoMasculinoTOTAL
4,31     (%)4,44    (%)3,69  (%)

 

Tabela 13 – Erro Amostral por raça autodeclarada (SÃO GONÇALO)
BrancoPretoPardoAmareloTOTAL
4,77   (%)8,82   (%)4,61  (%)39,94   (%)3,69 (%)

 

Tabela 14 – Amostra Final (SÃO GONÇALO)
 15 a 19 anos20 a 24 anos25 a 29 anos
 homensmulhereshomensMulhereshomensmulheres
 158161159170169183
TOTAL319329352
Pretos384144
191920212123
Brancos129139152
646567727379
Pardo152149156
757772777581

METODOLOGIA DE COLETA E ANÁLISE DE DADOS

Instrumento de Coleta

A investigação, como já dito, busca levantar dados a respeito da incidência do racismo sobre a empregabilidade da juventude em Niterói e São Gonçalo. Para isso, desde sua proposição, a etapa quantitativa da pesquisa previa entrevistas estruturadas com jovens escolhidos aleatoriamente nas ruas dos dois municípios. Guiada por tais parâmetros, e após uma revisão da bibliografia sobre empregabilidade e racismo, a equipe da Bem TV – Educação e Comunicação produziu um questionário com 17 ítens.

Submetido ao grupo da Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra o questionário sofreu várias alterações e na sequência foi testado junto a jovens de Niterói e de São Gonçalo, contemplando todas as categorias de faixa etária, raça e sexo, nas proporções previstas pelo plano amostral, mas num quantitativo reduzido. Profissionais da Bem TV foram a pontos de grande circulação dos dois municípios, colhendo, em cada um deles, 100 entrevistas com jovens transeuntes. O objetivo da testagem era avaliar a viabilidade do questionário no que diz respeito ao tempo de sua aplicação e à clareza das perguntas. O teste resultou na eliminação de alguns ítens e aperfeiçoamento de outros.

Em seu formato final o questionário apresenta 25 ítens divididos em três blocos: A) dados socioeconômicos (7 itens de múltipla escolha), B) dados sobre a inserção do jovem no mundo do trabalho (12 ítens de múltipla escolha), C) dados acerca da percepção do jovem sobre o racismo no mundo do trabalho (6 ítens dicotômicos). (Ver quadro 1)

Os questionários não foram aplicados de maneira uniforme a todos os entrevistados. As 7 perguntas do bloco “A”, as perguntas B8, B9, B10 e B19, bem como a pergunta C20, foram direcionadas a todos os jovens. (No quadro 1 esses ítens estão sinalizados com a cor “cinza”). Caso o entrevistado declarasse já ter trabalhado (ítem B10), a ele também deveriam ser direcionadas as perguntas B11, B12, B18, bem como as perguntas de C21 a C25. (No quadro 1 esses ítens estão sinalizados com a cor “azul”). Se o entrevistado respondesse que estava trabalhando naquele momento (pergunta B12), seria submetido também aos ítens de B13 a B17. (No quadro 1 sinalizados com a cor “verde”). Esse modo de aplicar as entrevistas resultou em perguntas que possuem menor número de respostas que o universo da pesquisa, como poderemos observar posteriormente nas análises de resultados.

 

Quadro 1 – Questionário – Dicionário de Variáveis

IdentificaçãoItemOpções de resposta
A.Dados socioeconômicos
A1Sexo1 = Masculino
2 = Feminino
A2Raça1 = Branco
2 = Preto
3 = Pardo
A3faixa etária1 = 15 a 19 anos
2 = 20 a 24 anos
3 = 25 a 29 anos
A4faixa de renda familiar (APROXIMADO)1 = 0 a 1 salário mínimo
2 = 1 a 3 salários mínimos
3 = 3 a 5 salários mínimos
4 = 5 a 15 salários mínimos
5 = + de 15 salários mínimos
A5Escolaridade da mãe1 = Não Sabe Declarar
2 = Analfabeta
3 = Sabe Ler e Escrever
4 = Fundamental Incompleto
5 = Fundamental Completo
6 = Ensino Médio Incompleto
7 = Ensino Médio Completo
8 = Nível Superior Incompleto
9 = Nível Superior Completo
10 = Pós Graduação
A6Escolaridade do pai1 = Não Sabe Declarar
2 = Analfabeto
3 = Sabe Ler e Escrever
4 = Fundamental Incompleto
5 = Fundamental Completo
6 = Ensino Médio Incompleto
7 = Ensino Médio Completo
8 = Nível Superior Incompleto
9 = Nível Superior Completo
10 = Pós Graduação
A7Escolaridade do jovem1 = Não Sabe Declarar
2 = Analfabeto
3 = Sabe Ler e Escrever
4 = Fundamental Incompleto
5 = Fundamental Completo
6 = Ensino Médio Incompleto
7 = Ensino Médio Completo
8 = Nível Superior Incompleto
9 = Nível Superior Completo
10 = Pós Graduação
B. Dados sobre empregabilidade
B8Estuda no momento atual?1 = Sim
2 = Não
B9Você já acionou algum programa público de formação profissional? (Pronatec, Projovem, FIES, Prouni)1 = Sim
2 = Não
B10Já trabalhou?1 = Sim
2 = Não
B11Há quanto tempo trabalha? (quando você começou a trabalhar?)1 = Menos De 1 Ano
2 = 1 a 3 Anos
3 = 3 a 5 Anos
4 = 5 a 7 Anos
5 = Mais de 7 Anos
B12Trabalha no momento atual?1 = Sim
2 = Não
B13Caso trabalhe, qual o seu vínculo empregatício?1 = CLT
2 = Contrato Temporário
3 = Funcionário Público Concursado
4 = Funcionário Público Comissionado
5 = Estágio ou Bolsa
6 = Jovem Aprendiz
7 = Microempreendedor Individual (MEI)
8 = Autônomo Com RPA
9 = Autônomo Informal
B14Caso trabalhe, qual o nível de escolaridade exigido pelo seu emprego?1 = Pode Ser Analfabeto
2 = Exige saber ler e escrever
3 = Exige Conhecimento Técnico
4 = Exige Ensino Fundamental
5 = Exige Ensino Médio Regular
6 = Exige Ensino Médio Técnico
7 = Exige Estar Cursando Ensino Superior
8 = Exige Ensino Superior
9 = Exige Pós Graduação
B15Em que segmento do mercado você trabalha?1 = Setor Doméstico
2 = Iniciativa Privada
3 = Serviço Público
B16Caso trabalhe, quanto você ganha?1 = 0 a 1 salário mínimo
2 = 1 a 3 salários mínimos
3 = 3 a 5 salários mínimos
4 = 5 a 15 salários mínimos
5 = + de 15 salários mínimos
B17Em relação ao seu emprego atual como você se sente?1 = Muito Satisfeito
2 = Satisfeito
3 = Indiferente
4 = Insatisfeito
5 = Muito Insatisfeito
B18Você já acionou algum órgão ou instituição pública para conseguir ajuda na busca de emprego?1 = Sim
2 = Não
B19Você conhece o sistema Nacional de emprego? (SINE)1 = Sim
2 = Não
C. Dados sobre empregabilidade e racismo (só para quem já está no mercado de trabalho)
C20Você acha que determinados trabalhos / profissões são definidos pela cor da pele?1 = Sim
2 = Não
C21A cor da sua pele influencia o tipo de emprego que você procura?1 = Sim
2 = Não
C22Na sua percepção, a cor da sua pele prejudica ou já prejudicou sua contratação em empregos?1 = Sim
2 = Não
C23Na sua percepção, a cor da sua pele interfere ou já inteferiu na sua relação com colegas de trabalho?1 = Sim
2 = Não
C24Na sua percepção, a cor da sua pele intefere ou já interferiu na sua relação com superiores no trabalho ou contratantes?1 = Sim
2 = Não
C25Você diria que já sofreu situações de racismo, injúria racial ou discriminação no trabalho?1 = Sim
2 = Não

3.2. Coleta de Dados

Para viabilizar o caráter aleatório da coleta de dados – ou seja, para que qualquer jovem morador de Niterói ou São Gonçalo tivesse igual probabilidade de ser entrevistado   –   o   instrumento   de   coleta de dados (questionário) foi aplicado de forma presencial   por   entrevistadores   distribuídos   em   oito   pontos de Niterói e oito pontos de São Gonçalo, em diferentes horários e dias da semana.

Em cada cidade, esses pontos foram inicialmente indicados pela equipe da pesquisa, a partir de dois critérios: a) por constituírem zonas de grande circulação da população em geral, b) por observarem grande volume de população jovem. No caso de Niterói foi incluso ainda o bairro de Itaipu para contemplar a Região Oceânica da cidade, que não respondia a nenhum dos dois critérios iniciais, mas que contempla um segmento bastante específico da população do município.

O número de questionários a ser coletado em cada ponto também foi especificado. Considerando a amostra de 1000 informantes por município, estes deveriam ser abordados em quantidade proporcional ao tamanho da população jovem de cada bairro. Quanto maior a juventude no bairro, maior o número de entrevistados no local. As informações acerca do número de habitantes dos bairros tiveram como referência o sítio eletrônico “População” (http://populacao.net.br/).

Em diálogo com os representantes da Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra, dois pontos de coleta de dados em São Gonçalo foram alterados. Embora com grande volume de população jovem, os bairros de Laranjal e Santa Isabel foram apontados como “regiões dormitório”, que permaneceriam esvaziadas durante o dia, dificultando a coleta de dados. Estes bairros foram substituídos por Colubandê e Bom Retiro os quais, ainda segundo os integrantes de São Gonçalo da Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra, são áreas de grande movimentação.

 

Pontos de coleta de dados – NITERÓI:

Engenhoca (125 questionários)

Alameda São Boaventura (100 questionários)

Centro (150 questionários)*

Icaraí (150 questionários)

Ingá, (125 questionários)

Largo da Batalha (125 questionários)*

Largo do Marrão, (125 questionários)

Itaipu (100 questionários)**

 

Pontos de coleta de dados – SÃO GONÇALO:

Alcântara, (150 questionários)*

Zé Garoto, (150 questionários)*

Rio do Ouro, (100 questionários)

Arsenal, (125 questionários)

Jardim Catarina, (150 questionários)

Bom Retiro, (100 questionários)

Colubandê,  (100 questionários)

Trindade,  (125 questionários)

*pontos incluídos por constituírem áreas de grande circulação

**ponto incluído para contemplar a Região Oceânica de Niterói.

 

Foram selecionados quatro profissionais para realizar as entrevistas nas ruas. O processo de contratação foi divulgado pela Bem TV através de redes sociais. Ao todo se candidataram 17 pessoas. Todas passaram por análise de curriculo e entrevista presencial. Foram selecionados um homem negro e três mulheres, sendo duas negras e uma branca. No decorrer do processo de coleta, uma das pesquisadoras negras foi afastada por questões técnicas, sendo substituída por outra mulher branca. Os questionários produzidos com erro pela entrevistadora afastada foram refeitos.

Os critérios de seleção dos entrevistadores incluiram, nessa ordem: disponibilidade de tempo, residência em Niterói ou São Gonçalo, participação na Frente Papa Goiaba de Promoção dos Direitos da Juventude Negra e experiência prévia com coleta de dados para pesquisas quantitativas. A coleta aconteceu em 2017, de 15/05 a 30/06 na cidade de Niterói e de 01/07 a 30/10 na cidade de São Gonçalo.

Os entrevistaddores se dividiram por região da cidade, abordando os jovens nas ruas aleatoriamente, e preenchendo questionários em papel. Cada entrevistador(a) buscava contemplar a quantidade de informantes por sexo, raça e faixa etária, de modo a satisfazer o plano amostral. Caso a coleta gerasse um número excedente de questionários em relação a quaisquer um dos estratos, este excedente era aleatoriamente desprezado. Em 50% dos dias trabalhados cada entrevistador contou com a supervisão de um profissional da coordenação da pesquisa. Ao longo de toda a coleta aconteceram reuniões semanais dos entrevistadores com os coordenadores, para a análise do quanto se havia avançado na cobertura do plano amostral, relato de dificuldades e outras orientações.

Os questionários coletados nas ruas foram fotocopiados, sendo os originais mantidos na sede da BemTV, e as cópias levadas até o Centro de Ciências da Matemática e da Natureza (UFRJ) onde, os quatro alunos extensionistas participantes do projeto (todos estudantes negros dos cursos de estatística e ciências atuariais) foram incumbidos de transpor as informações para compor um banco de dados, sob a orientação da professora Marina Silva Paez, estatística responsável pela investigação junto à UFRJ. O software de planilhas utilizado foi o Open Office, um software livre disponível nos laboratórios do Instituto de Matemática da UFRJ.

Cada questionário original foi identificado com código composto pelas iniciais da cidade em que foi coletado (SG ou NIT) e um número, para controle do trabalho de transcrição, garantindo que nenhum questionário ficaria de fora ou seria duplamente lançado na base de dados. Cada pergunta do questionário foi identificada na planilha conforme o bloco que pertencia (A, B ou C), e com uma numeração crescente (de 1 a 25). Os quatro extensionistas trascreveram 500 questionários, cada um. Ao todo, foram lançados mil questionários de São Gonçalo e mil de Niterói, contemplando integralmente o plano amostral.

 

Metodologia de Análise de Dados

Sob orientação da professora Marina Silva Paez do Departamento de Métodos Estatísticos do Instituto de Matemática da UFRJ, foi realizada a análise de dados utilizando o software “R”[3]. A opção se deve principalmente pelo fato de se tratar de um software livre e colaborativo, que não apenas dispõe de todas as ferramentas necessárias à pesquisa; apresentando-se flexível em relação à programação, como viabiliza o aprofundamento das análises por qualquer interessado sem limitações relativas a patentes ou licenças. Sendo esta uma investigação que tem por objetivo empoderar segmentos sociais vulnerabilizados, entendemos o uso de softwares livres como uma vantagem importante.

Inicialmente foram produzidas análises descritivas de todos os ítens do questionário, para cada uma das cidades, buscando verificar a distribuição das respostas. Na sequência optou-se por estatísticas de associação entre pares de variáveis. As análises descritivas não apenas revelaram aspectos de interesse, como premitiram identificar as variáveis passíveis de serem associadas com outras, já que as estatísticas de associação só se viabilizam envolvendo variáveis com mais de 5 (cinco) observações em cada categoria de resposta.

As estatísticas de associação foram iniciadas com a exportação para o “R” de duas planilhas – uma para Niterói, outra para São Gonçalo – contendo, cada uma, mil linhas correspondentes aos questionários respondidos, e 25 colunas, correspondendo às questões constituintes do mesmo, doravante denominadas variáveis. Na transcrição para a planilha foram utilizadas as correspondências numéricas das respostas, estabelecidas arbitrariamente e descritas no dicionário de variáveis (quadro 1). Como resultado obteve-se uma planilha em que as variáveis assumiam valores numéricos. Cabe salientar que algumas variáveis tinham respostas relativas aos 1000 questionários, enquanto outras não, uma vez que nem todas as perguntas foram dirigidas a todos os informantes, conforme explicitado no ítem 3.1. (Instrumento de coleta de dados).

Foram então analisadas as relações possíveis entre pares de variáveis através da criação de tabelas de contingência, aplicando-se em seguida o teste do Qui-quadrado de Pearson, que mede o grau de relacionamento entre duas variáveis categóricas, ou seja, se a ocorrência de uma afeta a ocorrência da outra. Cabe salientar que a base de dados utilizada atende a todos os pré-requisitos para a aplicação do teste do Qui-quadrado de Pearson, visto que: a) tratam-se de variáveis categóricas, b) a amostra é aleatória, c) há uma quantidade robusta de dados (1000 informantes por município), e d) as observações são independentes, ou seja, cada questionário é correspondente a um informante individualmente (PINHEIRO et al, 2015). Ao todo foram analisadas 74 associações entre variáveis para cada município. A cada associação realizada corresponde uma tabela de contingência e uma distribuição de probabilidade conjunta de contingência com porcentagens.

Nas análises de associação o grau de significância adotado foi de 5%, pressupondo, portanto, um p-valor menor ou igual a 0,05 para considerar uma relação significativa entre duas variáveis (GAUVREAU e PAGANO, 1994; MORETTIN e BUSSAB, 2000). Além disso, como já mencionado, não foram reconhecidas as associações entre variáveis em que a tabela de contingência continha células com frequência menor que 5. Ou seja, variáveis com alguma categoria de resposta escolhida por menos de 5 entrevistados. No processo de construção de algumas tabelas de contingência, os valores das variáveis foram unidos para possibilitar o cálculo confiável dos coeficientes do Qui-quadrado e do p-valor. Foram os casos das seguintes variáveis:

  • B13 – Vínculo Empregatício: os valores “2 = Contrato Temporário”, “3 = Funcionário Público Concursado”, “4 = Funcionário Público Comissionado”, foram unidos ao valor “1 = CLT”. Os valores “7 = Microempreendedor Individual”, “8 = Autônomo Com RPA” foram unidos à categoria “9 = Autônomo Informal”; E o valor “6 = Jovem Aprendiz” foi unidos ao “5 = Estágio ou Bolsa”.
  • A4 – Faixa de Renda Familiar: teve o valor “+ de 15 salários mínimos” unido ao valor “5 a 15 salários mínimos”.

Coeficientes significativos e confiáveis foram observados em 24 associações em São Gonçalo e 27 em Niterói.

 

[1] Nota Técnica: “Histórico da investigação sobre cor ou raça nas pesquisas domiciliares do IBGE”, (IBGE, 2013)

[2] A variabilidade máxima seria obtida no caso da população ser igualmente dividida pelas categorias possíveis. Por exemplo, se tivéssemos 50% homens e 50% mulheres, 33,3%  de brancos, pretos e pardos, e 33,3% de jovens entre 15 e 19 anos,  entre 20 e 24 e entre 25 e 29 anos.

[3] R: A language and environment for statistical computing. R Foundation for Statistical Computing, Vienna, Austria. URL” (https://www.r-project.org/about.html).

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